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Deus abençoe por Maria!
Leo J. Trese
Agora que nos dispomos a estudar o sacramento da Sagrada Eucaristia, vamos passar por uma situação semelhante à do viajante que torna a percorrer uma região bem conhecida. Encontraremos muitas paisagens familiares - neste caso, verdades já vistas anteriormente. Mas, nas verdades que vamos recordar, confiamos em que haveremos de notar aspectos de interesse que antes nos passaram despercebidos. Podemos também confiar em descobrir outras paisagens - outras verdades - que escaparam totalmente à nossa observação em viagens anteriores por essa região amada e familiar, que é o tema do maior dos sacramentos.
Quando dizemos que a Sagrada Eucaristia é o maior dos sacramentos, afirmamos algo evidente. O Batismo é, sem dúvida, o sacramento mais necessário; sem ele, não podemos ir para o céu. No entanto, apesar das maravilhas que o Batismo e os outros cinco sacramentos produzem na alma, não são senão instrumentos de que Deus se serve para nos dar a sua graça; mas na Sagrada Eucaristia não temos apenas um instrumento que nos comunica as graças divinas: é-nos dado o próprio Dador da graça, Jesus Cristo Nosso Senhor, real e verdadeiramente presente.
"A Eucaristia é <<fonte e centro de toda a vida cristã>> (LG 11). <<Os restantes sacramentos, porém, assim como todos os ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam. Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, nossa Páscoa>> (PO 5)" (n. 1324).
O sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo tem tido muitos nomes ao longo da história cristã: Pão dos Anjos, Ceia do Senhor, Sacramento do altar e outros que nos são bem conhecidos. Mas o nome que permaneceu desde o princípio, o nome que a Igreja dá oficialmente a este sacramento é Sagrada Eucaristia. Provém do Novo Testamento. Os quatro escritores sagrados - Mateus, Marcos, Lucas e Paulo - que nos narram a Última Ceia, dizem-nos que Jesus tomou o pão e o vinho em suas mãos e deu graças". E assim, da palavra grega eucharistia, que significa "ação de graças", resultou o nome do nosso sacramento: Sagrada Eucaristia.
O Catecismo ensina-nos que a Eucaristia é ao mesmo tempo sacrifício e sacramento. Como sacrifício, a Eucaristia é a Missa, a ação divina em que Jesus, por meio de um sacerdote humano, transforma o pão e o vinho no seu próprio corpo e sangue e continua no tempo o oferecimento que fez a Deus no Calvário, o oferecimento de Si próprio em favor dos homens.
"A sagrada Eucaristia completa a iniciação cristã. Aqueles que foram elevados à dignidade do sacerdócio real pelo Batismo e configurados mais perfeitamente a Cristo pela Confirmação, esses, por meio da Eucaristia, participam, com toda a comunidade, no próprio sacrifício do Senhor. [...] A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, a atualização e oferecimento sacramental do seu único sacrifício, na Liturgia do Igreja que é o seu Corpo" (ns. 1322 e 1362).
O sacramento da Sagrada Eucaristia adquire o seu ser (ou é "confeccionado", como dizem os teólogos) na Consagração da Missa; nesse momento, Jesus torna-se presente sob as aparências do pão e do vinho. E enquanto essas aparências permanecerem, Jesus continua a estar presente e o sacramento da Sagrada Eucaristia continua a existir nelas. O ato pelo qual se recebe a Sagrada Eucaristia chama-se Sagrada Comunhão. Podemos dizer que a Missa é a "confecção" da Sagrada Eucaristia e que a comunhão é a sua recepção. Entre uma e outra, o sacramento continua a existir (como no sacrário), quer o recebamos, quer não.
Ao tratarmos de aprofundar no conhecimento deste sacramento, não temos melhor maneira de fazê-lo do que começando por onde Jesus começou: por aquele dia na cidade de Cafarnaum em que fez a mais incrível das promessas, a de dar a sua carne e o seu sangue como alimento da nossa alma.
"Os milagres da multiplicação dos pães - quando o Senhor disse a bênção, partiu e distribuiu os pães pelos seus discípulos para alimentar a multidão -, prefiguram a superabundância deste pão único da Sua Eucaristia" (n. 1335).
Na véspera, Jesus tinha lançado os alicerces da sua promessa. Sabendo que ia fazer uma tremenda exigência à fé dos seus ouvintes, preparou-os para ela. Sentado numa ladeira, do outro lado do mar de Tiberíades, tinha pregado a uma grande multidão que o havia seguido até ali, e agora, já ao cair da tarde, prepara-se para despedi-los. Mas, movido de compaixão e como preparação para a sua promessa do dia seguinte, faz o milagre dos pães e dos peixes. Alimenta a multidão - só os homem eram cinco mil - com cinco pães e dois peixes; e, depois de todos se terem saciado, os seus discípulos recolhem doze cestos de sobra. Esse milagre haveria de estar presente no dia seguinte (ou deveria estar) na mente dos que o escutaram.
Tendo despedido os que o tinham seguido, subiu monte acima, a fim de orar em solidão como era seu costume. Mas não era muito fácil separar-se daquela multidão, que queria ver mais milagres e ouvir mais palavras de sabedoria de Jesus de Nazaré: acamparam por ali para passar a noite e viram os discípulos embarcar (sem Jesus) rumo a Carfanaum, na única barca que havia. Nessa noite, depois de terminar a oração, Jesus atravessou andando as águas tomentosas do lago e juntou-se aos seus discípulos na barca, e assim chegou com eles a Cafarnaum.
Na manhã seguinte, a turba não conseguia encontrar Jesus. Quando chegaram outras barcas de Tiberíades, desistiriram de procurá-lo e embarcaram para Carfanaum. Qual não foi o seu assombro ao encontrarem de novo Jesus, que havia chegado antes deles, sem ter subido à barca que partira na noite anterior! Foi outro portento, outro milagre que Jesus fez para fortalecer a fé daquela gente (e dos discípulos), pois ia pô-la à prova pouco depois.
Os discípulos e os que conseguiram entrar aglomeraram-se em seu redor na sinagoga de Carfanaum. Foi ali e então que Jesus fez a promessa que hoje nos enche de fortaleza e vida: prometeu a sua Carne e o seu Sangue como alimento; prometeu a Sagrada Eucaristia.
Se tinha poder para multiplicar cinco pães e com eles alimentar cinco mil homens, como não havia de tê-lo para alimentar toda a humanidade com um pão celestial feito por Ele?! Se tinha poder para andar sobre as águas como se fosse terra firme, como não havia de tê-lo para ordenar aos elementos do pão e do vinho que lhe emprestassem a sua aparência e para utilizá-la como capa para a sua Pessoa? Jesus tinha preparado bem os seus ouvintes e, como veremos, eles tinham necessidade disso.
Se você tem um exemplar do Novo Testamento à mão, será muito bom que leia inteiro o capítulo sexto do Evangelho de São João. Só assim poderá captar todo o ambiente, as circunstâncias e o desenrolar dos acontecimentos na sinagoga de Carfanaum. Vou citar somente as linhas mais pertinentes, que começam no versículo 51 e acabam no 67.
Disse Jesus: Eu sou o pão vivo que desceu do céu. [...] Quem comer deste pão viverá eternamente; e o pão que eu darei é a minha carne para a salvação do mundo. Disputavam, pois, entre si os judeus, dizendo: Como pode este dar-nos a comer a sua carne? Jesus disse-lhes: Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. O que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne é verdadeiramente comida e o meu sangue é verdadeiramente bebida. [...] Este é o pão que desceu do céu. Não é como o pão que comeram os vossos pais e morreram. O que come deste pão viverá eternamente [...]. Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isso, disseram: Dura é esta linguagem, e quem a pode ouvir? Jesus, conhecendo em si mesmo que os seus discípulos murmuravam por isso, disse-lhes: [...] As palavras que eu vos disse são espírito e vida. Mas há alguns de vós que não crêem [...] Desde então, muitos dos seus discípulos tornaram atrás e já não andavam com ele.
Este breve extrato da capítulo sexto de São João contém os dois pontos que mais nos interessam agora: os dois pontos que nos dizem, meses antes da Última Ceia, que na Sagrada Eucaristia estarão presentes o verdadeiro Corpo e o verdadeiro Sangue de Jesus. Lutero rejeitou a doutrina da presença verdadeira e substancial de Jesus na Eucaristia, doutrina que havia sido seguida firmemente por todos os cristãos durante mil e quinhentos anos. Lutero aceitava certa espécie de presença de Cristo, ao menos no momento em que se recebesse a comunhão. Mas no terreno adubado por Lutero brotaram outras confissões protestantes que foram recusando mais e mais a crença na presença real. Na maioria das confissões protestantes de hoje, o "serviço da comunhão" não passa de um simples rito comemorativo da morte do Senhor; o pão continua a ser pão e o vinho continua a ser vinho.
Nos seus esforços por eludir a doutrina da presença real, teólogos protestantes procuraram mitigar as palavras de Jesus, afirmando que Ele não pretendia que as tomassem no seu sentido literal, mas apenas espiritual ou simbolicamente. Mas é evidente que não se podem diluir as palavras de Cristo sem violentar o seu sentido claro e rotundo. Jesus não poderia ter sido mais enfático: A minha carne é verdadeiramente comida e o meu sangue é verdadeiramente bebida. Não há forma de dizê-lo com mais clareza. No original grego, que é a língua em que São João escreveu o seu Evangelho, a palavra do versículo 55 que traduzimos por "comer" estaria mais próxima do seu sentido original se a traduzíssemos por "mastigar" ou "comer mastigando".
Tentar explicar as palavras de Jesus como simples modo de expressar-se levar-nos-ia a outro beco sem saída. Entre os judeus, que eram aqueles a quem Jesus se dirigia, a única ocasião em que a frase "comer a carne de alguém" se utilizava figurativamente era para significar ódio a determinada pessoa ou perseguir alguém com furor. De modo parecido, "beber o sangue de alguém" queria indicar que esse alguém seria castigado com penas severas. Nenhum desses significados - os únicos que os judeus conheciam - se revela coerente se os aplicarmos às palavras de Jesus.
Outra prova de peso, que confirma que Jesus quis verdadeiramente dizer o que disse - que o seu corpo e o seu sangue estariam realmente presentes na Eucaristia - está em que alguns dos seus discípulos o abandonaram por terem achado a ideia de comê-lo demasiado repulsiva. Não tiveram fé suficiente para compreender que, se Jesus lhes ia dar a sua Carne e o seu Sangue em alimento, o faria de forma a não causar repugnância à natureza humana. Por isso o abandonaram, "e já não andavam com ele".
"O primeiro anúncio da Eucaristia dividiu os discípulos, tal como o anúncio da Paixão os escandalizou: Estas palavras são insuportáveis! Quem as pode escutar? (Jo 6,60). A Eucaristia e a Cruz são pedras de tropeço. É o mesmo mistério e continua a ser motivo de divisão. Também vós quereis ir-vos embora? (Jo 6,67). Esta pergunta do Senhor ecoa através dos tempos, como convite do seu amor a que descubramos que só Ele tem palavras de vida eterna (Jo 6,68) e que acolher na fé o dom da sua Eucaristia é acolhê-lo a Ele mesmo" (n. 1336).
Jesus nunca os teria deixado ir-se embora se essa deserção fosse simples resultado de um mal-entendido. Muitas vezes antes tinha-se dado ao trabalho de esclarecer as suas palavras quando eram mal compreendidas. Por exemplo, quando disse a Nicodemos que era preciso nascer de novo, e este lhe perguntou como é que um adulto podia entrar de novo no ventre de sua mãe (cf. Jo 3,3 e segs.); pacientemente, Jesus esclareceu-lhes as suas palavras sobre o Batismo. Mas agora, em Carfanaum, Jesus não esboça o menor gesto para impedir que os seus discípulos o abandonem nem para lhes dizer que o haviam entendido mal. Não pode fazê-lo pela simples razão de que o tinham entendido perfeitamente e por isso o deixaram. O que lhes faltou foi fé, e Jesus, tristemente, teve que resignar-se a vê-los partir.
Tudo isto faz com que a afirmação da doutrina da presença real esteja ineludivelmente contida na promessa de Cristo, porque, se não fosse assim, as suas palavras não teriam sentido, e Jesus não falava por enigmas indecifráveis.
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A fé explicada - Padre Leo J. Trese. Ed.Quadrante, 14ª edição, 2014.
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