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Deus abençoe por Maria!
Pe. Leo J. Trese
Na sinagoga de Cafarnaum, quase um ano antes da sua morte, Jesus prometeu dar o seu próprio corpo e o seu próprio sangue como alimento para a salvação dos homens. Na Última Ceia, nas vésperas da sua crucifixão, cumpriu a sua promessa. Legou à Igreja e a cada um dos seus membros, não terras, casas ou dinheiro, mas um legado como só Deus nos podia dar: o dom da sua própria Pessoa viva.
No Novo Testamento, há quatro relatos da instituição da Eucaristia. São os de Mateus (26, 26-28), Marcos (14, 22-24), Lucas (22, 19-20) e Paulo (1 Cor 11, 23-29). São João, que é quem nos conta a promessa da Eucaristia, não se preocupa de repetir a história da instituição deste sacramento. Foi o último Apóstolo a escrever um Evangelho, e conhecia os outros relatos. Em seu lugar, decide transmitir-nos as belíssimas palavras finais de Jesus aos seus discípulos na Última Ceia.
Eis aqui o relato da instituição da Sagrada Eucaristia segundo nos conta São Paulo: O Senhor Jesus, na noite em que foi entregue, tomou o pão e, dando graças, partiu-o e disse: Tomai e comei; isto é o meu corpo, que será entregue por vós; fazei isto em memória de mim. Igualmente também, depois de ter ceado, tomou o cálice e disse: Este cálice é o novo testamento no meu sangue; fazei isto em memória de mim todas as vezes que o beberdes.
As suas palavras não podiam ser mais claras. "Isto" queria dizer "esta substância que tenho em minhas mãos e que agora que começo a falar é pão e ao terminar não será já pão, mas o meu próprio corpo". "Este cálice" queria dizer "este cálice que agora que começo a falar contém vinho, e ao terminar não será mais vinho, mas o meu próprio sangue".
"Isto é o meu corpo" e "este cálice... é o meu sangue". Os Apóstolos tomaram as palavras de Jesus literalmente. Aceitaram como um fato (e que ato de fé, essa aceitação!) que a substância que ainda parecia pão era agora o Corpo de Jesus; e que a substância que continuava a parecer vinho era agora o Sangue de Cristo.
Essa foi a doutrina que os Apóstolos pregaram à Igreja nascente. Essa foi a crença universal dos cristão durante mil anos. No século XI, um herege chamado Berengário pôs em dúvida a verdadeira da presença real, e ensinava que Jesus tinha falado apenas em sentido figurado e, assim, o pão e o vinho consagrados não eram realmente o seu corpo e o seu sangue. A heresia de Berengário foi condenada por três concílios, e Berengário retratou-se do seu erro e voltou ao redil. A doutrina da presença real permaneceu, indiscutida por outros quinhentos anos.
No século XVI, chegaram Lutero e a reforma protestante. O próprio Lutero não negou inteiramente a presença real de Jesus na Eucaristia. Admitia que as palavras de Jesus eram demasiado terminantes para que fosse possível explicá-las de outro modo. Mas Lutero queria abolir a Missa, bem como a adoração de Jesus presente no altar. Por isso, tratou de resolver o seu dilema ensinando que, embora o pão continuasse a ser pão e o vinho, vinho, Jesus se faz presente juntamente com as substâncias do pão e do vinho; mas sustentava que Jesus está presente apenas no momento em que se recebe o pão e o vinho; não antes nem depois.
Outros reformadores protestantes foram mais longe que Lutero e acabaram por negar complemente a presença real. Tanto eles como os teólogos protestantes que lhes sucederam sustentaram que, quando Jesus disse: "Isto é o meu corpo" e "Isto é o meu sangue", lançou mão de um recurso de linguagem, e que o que queria dizer era: "Isto representa o meu corpo" ou "Isto é um símbolo do meu sangue". Na sua tentativa de alterar as palavras de Cristo, tiveram que valer-se de todo o tipo de interpretações inverossímeis, mas deixaram sem respostas as razões realmente sólidas que provam que Jesus disse o que queria dizer e que quis dizer o que disse.
A primeira delas reside na solenidade da ocasião: a noite anterior à sua morte. Nela, Jesus faz o seu testamento, deixa-nos a sua última vontade. Um testamento não é um documento apropriado para empregar uma linguagem figurada; mesmo nas circunstâncias mais favoráveis, os tabeliães têm, às vezes, dificuldade em interpretar as intenções do testador, quanto mais se este emprega uma linguagem simbólica.
Mais ainda: sendo Deus, Jesus sabia que, em consequência das palavras que ia pronunciar naquela noite, milhões e milhões de pessoas lhe prestariam culto sob a aparência de pão. Se não tivesse querido estar realmente sob essas aparências, os adoradores prestariam culto a um simples pedaço de pão e incorreriam no pecado de idolatria, e isto, certamente, não é coisa a que o próprio Deus quisesse induzir-nos, preparando o cenário e utilizando obscuros modos de falar.
Que os Apóstolos tomaram literalmente as palavras de Jesus é evidente, pois os cristãos creram os primórdios na presença real de Jesus na Eucaristia. De ninguém mais, além dos Apóstolos, poderiam ter obtido essa crença. E quem melhor do que este nos poderia ter perguntado a Jesus - e certamente o fizeram - todas as questões que lhes ocorressem sobre o significado das palavras que acabavam de ouvir. Às vezes, tendemos a esquecer que os Evangelhos registram apenas uma pequena parte do que se passou entre Jesus e os Apóstolos. Compilar três anos de diálogo, de perguntas e respostas, de ensinamentos, requereria um montão de livros.
Quando, na noite de Quinta-feira Santa, Jesus pronunciou as palavras: "Isto é o meu corpo" sobre o pão, e "Isto é o meu sangue" sobre o vinho, os Apóstolo tomaram essas palavras ao pé da letra, como se prova claramente pela sua conduta posterior. Se Jesus lançou mão de uma metáfora, se o que na realidade quis dizer era: "Este pão é como que um símbolo do meu corpo e este vinho significa o meu sangue; portanto, cada vez que os meus seguidores se reunirem e participarem de um pão e um vinho como estes, honrar-me-ão e representarão a minha morte"; se foi o que Jesus quis dizer, então todos os Apóstolos o entenderam mal. E, através da sua interpretação errônea, toda a cristandade - até que chegaram os protestantes - passou a adorar um pedaço de pão como se fosse Deus.
É totalmente insensato pensar que Jesus pudesse permitir que os seus discípulos caíssem num erro tão grave. Em outras ocasiões, em muitíssimas outras ocasiões, e tratando-se de matérias muito menos importantes que esta, Jesus corrige os seus Apóstolos quando o interpretam mal. Para citar um só exemplo no Evangelho de São Mateus (16, 6-12), Jesus diz aos seus Apóstolos que estejam prevenidos contra o fermento dos fariseus e dos saduceus. Eles pensam que lhes está falando de pão real, e cochicham entre si que não têm pão. Pacientemente, Jesus esclarece-lhes que se refere aos ensinamentos dos fariseus e saduceus, não ao pão que se come. Em outras ocasiões, quando Jesus se serve de metáforas, o próprio escritor sagrado nos esclarece o respectivo significado, como na ocasião em que Jesus disse: Destruí este tempo e eu o reedificarei em três dias, e João explica imediatamente que Ele se referia ao templo do seu corpo (cf. Jo 2, 19-22). Encontramos incidentes parecidos em grande abundância nos Evangelhos, e, no entanto, querem agora fazer-nos crer que, no momento solene da Última Ceia, Jesus utilizou modos de dizer novos e estranhos, sem se darem ao trabalho de explicar qual era o seu signficado.
Porque são modos de dizer novos e estranhos. Nem o pão é um símbolo natural do corpo humano, nem o vinho um símbolo do sangue. Se alguém cortasse uma fatia de pão e a oferecesse a outro comensal, dizendo-lhe: "Isto é o meu corpo", este pensaria logo que estava diante de um gozador ou de um louco varrido. E é blasfemo tratar de aplicar a Jesus qualquer das duas hipóteses.
Como recurso literário, só é válido lançar mão de um modo de dizer quando o seu significado é claro. Esta clareza pode resultar da natureza da afirmação, como quando mostro uma fotografia e digo: "É a minha mãe", ou aponto um menino irrequieto e digo: "É uma máquina de movimento contínuo", ou digo de um cavalo veloz: "É um raio"; ou quando me ponho a explicar o sentido da metáfora; por exemplo, quando coloco uns fósforos sobre a mesa e digo: "Esta é a minha casa, e aqui está a sala de jantar". Mas, nem pela natureza da afirmação, nem por explicações dadas, as palavras "Isto é o meu corpo" fazem sentido como metáfora.
A ideia de que Jesus teria falado em metáforas na Última Ceia torna-se ainda mais incrível se tivermos em conta que se dirigia a homens que, na sua maioria, eram uns pobres e incultos pescadores. Não tinham sido educados nas sutilezas da retórica. Mais ainda, antes de o Espírito Santo ter descido sobre eles, assombram-nos pelo seu lento entendimento das coisas. Temos um exemplo na passagem da ressurreição de Lázaro. Lemos em São João (11, 11-14) que, quando Jesus disse: O nosso amigo Lázaro dorme, mas vou despertá-lo, os discípulos replicaram: Senhor, se dorme, curar-se-á. Então Jesus disse-lhes claramente: Lázaro morreu. Eram mentalidades difíceis para lhes falar em metáforas!
Outra indicação de que Jesus não falava em metáforas ao instruir a Eucaristia, achamo-la nas palavras com que São Paulo conclui o seu relato da Última Ceia (1Cor 11, 27-30): Portanto, todo aquele que comer deste pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, a si mesmo o homem, e assim coma deste pão e beba do cálice, porque aquele que o come e bebe indignamente, come e bebe para si a condenação, não distinguindo o corpo do Senhor. É duro dizer que um homem se torna réu do Corpo e do Sangue do Senhor, que come e bebe a sua própria condenação, se o pão não é mais do que pão, mesmo que seja pão bento, e o vinho não é senão vinho, mesmo que seja vinho sobre o qual se tenham pronunciado umas orações.
Nós, certamente, não necessitamos de provas como as que aqui se esquematizaram para crer na presença real de Jesus Cristo na Sagrada Eucaristia. Cremos nessa verdade não por provas racionais, mas, primordialmente, porque a Igreja de Cristo, que não pode errar em matérias de fé e moral, assim no-lo diz. Mas sempre é útil conhecer as dificuldades com que tropeçam os que procuram interpretações pessoais nas palavras de Nosso Senhor.
Nós preferimos seguir a regra da sensatez que diz que, para conhecer o significado de uma coisa que se disse, não há melhor caminho do que perguntar a quem a ouviu ou que estava lá. Os Apóstolos estavam lá; os primeiros cristãos, os que escutaram a pregação dos Apóstolos, em certo sentido estavam lá. Mesmo nós, que herdamos uma tradição ininterrupta, em certo sentido estávamos lá. Independentemente de ser um dogma definido pela Igreja, preferimos crer nos ensinamentos dos Apóstolos e na crença unânime dos cristãos durante mil e quinhentos anos, em vez de prestar ouvidos aos ensimentos desencontrados dos reformadores protestantes. Homens como Lutero, Karlstadt, Zwingli ou Calvino exigem demasiado quando nos pedem para crer que durante quinze séculos os cristãos permaneceram no erro e que, de repente, eles, os reformadores protestantes, encontraram a resposta certa.
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A fé explicada - Padre Leo J. Trese. Ed.Quadrante, 14ª edição, 2014.
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