domingo, 22 de junho de 2025

Eucaristia - Já não é pão

 



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Padre Leo J. Trese


Que aconteceu exatamente quando Jesus disse na Última Ceia (e os sacerdotes esta manhã na missa): "Isto é o meu corpo" sobre o pão, e "Este é o cálice do meu sangue" sobre o vinho? Cremos que a substância do pão deixou de existir completa e totalmente, e que a substância do próprio Corpo de Cristo substituiu a substância do pão, que ficou aniquilada. Cremos também que Jesus, pelo seu poder onipotente como Deus, preservou as aparências do pão e do vinho, apesar de as respectivas substâncias terem desaparecido. 

Por "aparências" de pão e de vinho entendemos todas as formas externas e acidentais que de um modo ou de outro podem ser percebidas pelos sentidos da vista, do tato, do paladar, do ouvido e do olfato. A Sagrada Eucaristia ainda parece pão e vinho, ainda tem o sabor do pão e do vinho e cheira a pão e vinho, ainda é sensível ao tato como pão e vinho, e, se a partíssemos ou derramássemos, espalhar-se-ia como o pão e o vinho. Mesmo que fizéssemos um exame microscópico, eletrônico ou radiológico, só poderíamos perceber nela as qualidades do pão e do vinho. Com efeito, a observação humana só pode obter a aparência externa de qualquer coisa. A sua configuração, a sua reação a determinadas circunstâncias, as leis físicas a que parece obedecer, são as únicas questões que a ciência pode investigar. Mas a substância de uma coisa, o que lhe está subjacente, a substância como substância, está fora do alcance dos sentidos e dos instrumentos humanos. 

Hoje em dia, a ciência da física nuclear teoriza que toda a matéria é uma forma de energia; que toda a matéria se compõe de partículas em movimento, carregadas eletricamente. A diferença entre um pedaço de madeira e um pedaço de ferro é simplesmente a diferença entre o número, a velocidade e a direção das partículas carregadas eletricamente que compõem os dois materiais. Mas, mesmo que um físico consiga fotografar com uma câmara eletrônica algumas dessas partículas, ainda continuará a manejar aparências. A substância como substância, aquilo que faz uma coisa ser o que é e não outra coisa, continua a estar fora do alcance dos cientistas. 

Todo este tema da relação da substância (o que uma coisa é) com os acidentes (as qualidades perceptíveis de uma coisa) é uma questão filosófica, e não podemos estender-nos aqui na sua análise. Basta-nos saber, como sabemos, que, pelas palavras da Consagração, a substância do corpo de Cristo substitui a substância do vinho, ao mesmo tempo que permanecem as aparências do pão e do vinho. 

Evidentemente, é um milagre; um milagre contínuo, realizado centenas de milhares de vezes por dia pelo poder infinito de Deus. A bem dizer, é um duplo milagre: é o milagre da transformação do pão e do vinho em Jesus Cristo; e o milagre adicional pelo qual Deus mantém as aparências do pão e do vinho ainda que a substância subjacente tenha desaparecido, como se o rosto de uma pessoa permanecesse num espelho depois de a pessoa se ter retirado. 

A mudança operada pelas palavras da consagração é de um tipo especial, e a Igreja teve de cunhar um termo especial para a designar: transubstânciação, que, literalmente, significa a passagem de uma substância para outra; neste caso, é uma singular espécie de mudança. 

"O Concílio de Trento resume a fé católica declarando: <<Porque Cristo, nosso Redentor, disse que o que Ele oferecia sob a espécie do pão era verdadeiramente o seu Cristo, sempre na Igreja se teve esta convicção que o sagrado Concílio de novo declara: pela consagração do pão e do vinho opera-se a conversão de toda a substância do pão na substância do Corpo de Cristo nosso Senhor, e e de toda a substância do vinho na substância do seu Sangue; a esta mudança, a Igreja católica chama-lhe, com justeza e exatidão, transubstânciação>> (DS 1642)" (n. 1376).

Na vida ordinária, estamos acostumados a muitas espécies de mudanças. Às vezes, são mudanças apenas aparentes, externas, como quando a água congela e se torna sólida, ou um pedaço de barro é modelado e se torna um vaso. Vemos também mudanças que afetam tanto a substância como os acidentes, como quando o vinho se transforma em vinagre ou o carvão sob pressão se torna um diamante. Tem havido mudança milagrosas destes gênero, como a que Jesus operou em Caná, mudando a água em vinho. 

No entanto, em lugar nenhum da ordem natural e, pelo que conhecemos, também na ordem sobrenatural, se produzem mudanças semelhantes à que se opera no pão e no vinho pelas palavras da consagração: uma mudança de substância sem mudança de aparências. Por esta razão, a palavra "transubstânciação" aplica-se exclusivamente a esse milagre quotidiano. 

Ainda que pelas palavras da consagração o corpo de Jesus se torne presente sob as aparências do pão, e o seu sangue sob as aparências do vinho, sabemos que a Pessoa de Jesus, ressuscitado dentre os mortos, não pode ser dividida. Onde está o seu corpo, deve estar também o seu sangue; e onde estão o seu corpo e o seu sangue, devem estar também a sua alma e a sua natureza divina, a que estão unidos o seu corpo e o seu sangue. Do mesmo modo, onde está o sangue de Jesus, deve estar Jesus inteiro. Em consequência, pelas palavras "Isto é o meu corpo", torna-se presente não só o corpo de Jesus, como também - pelo que os teólogos chamam "concomitância", quer dizer, por força da sua unidade de Pessoa - o seu sangue, alma e divindade. O mesmo acontece na consagração do vinho. 

É por esta razão que não é necessário receber a Comunhão sob as duas espécies de pão e vinho, embora se possa fazê-lo nos casos previstos pelas normas litúrgicas. Se a recebemos sob qualquer das duas, seja pão, seja vinho, recebemos Jesus todo, completo e inteiro. 

Jesus Cristo, todo e inteiro, está presente na Sagrada Eucaristia sob as aparências do pão e do vinho. Está presente simultaneamente em cada uma das hóstias consagradas de cada altar de todo o mundo e em cada cálice consagrado onde quer que se celebre a Santa Missa. Mais ainda, Jesus todo e inteiro está presente em cada partícula consagrada e em cada gota de vinho consagrado. Se a sagrada hóstia se divide - como o sacerdote faz durante a missa -, Jesus está totalmente presente em cada uma das partes. Se caísse ao chão uma partícula da hóstia consagrada ou se derramasse uma gota do calíce, Jesus estaria presente todo e inteiro nessa partícula e nessa gota.

É por isso que os panos do altar têm que ser lavados com a máxima reverência, porque pode haver aderida a eles uma partícula das Sagradas Espécies. Estes panos de altar compreendem o corporal, sobre o qual se coloca a patena com a hóstia e o cálice consagrados durante a missa; a pala, o pano quadrado que cobre o cálice durante a missa; e o sanguíneo, o pano com que o sacerdote enxuga os lábios depois de consumir o precioso Sangue e seca os dedos e o cálice depois de lavar o cálice com vinho e água, ou só com água. Jesus, evidentemente, não deixa o seu lugar no céu, "à direita do Pai", para se tornar presente na Sagrada Eucaristia. Permanece no céu e está no altar. Quem se faz presente sob as aparências do pão e do vinho é o corpo glorificado de Jesus, o seu corpo como está no céu. 

A presença de Jesus na Eucaristia - sob dimensões tão pequenas e em tantos lugares ao mesmo tempo - parece suscitar duas aparentes dificuldades: Como pode um corpo humano estar presente num espaço tão pequeno? Como pode um corpo humano estar em vários lugares ao mesmo tempo? Estas dificuldades, é claro, são apenas aparentes. Deus assim o fez; portanto, pode ser feito. Deve-se recordar que Deus é o autor da natureza, o amo e o senhor da Criação. As leis físicas do universo foram estabelecidas por Ele, e Ele pode suspender a sua ação se assim o quiser, sem que o seu poder infinito tenha que fazer nenhum esforço. 

É verdade que, segundo a experiência humana, um corpo deve ter determinada "extensão", isto é, deve ocupar determinado espaço. Segundo a nossa experiência, um corpo deve estar num só lugar de cada vez. A multilocação (estar em vários lugares ao mesmo tempo) é algo desconhecido para nós. Pode-se, pois, afirmar que um corpo sem extensão no espaço, ou que ocupe vários lugares ao mesmo tempo, é um impossível físico; isto é, impossível para as leis físicas. Mas esses fenômenos não são impossíveis metafisicamente; quer dizer, não há contradição íntrinseca na idéia de um corpo sem extensão ou na idéia da multilocação. Uma contradição intrínseca torná-los-ia absolutamente impossíveis; estaria neste caso, por exemplo, a idéia de um círculo quadrado, que é uma contradição nos seus próprios termos. 

Talvez isto nos arraste excessivamente para o campo da filosofia. Mas os pontos que nos interessa deixar claros são: primeiro, que Jesus não está presente na Eucaristia em miniatura. Está ali  na plenitude da sua Pessoa glorificada, de uma maneira espiritualizada, sem extensão nem espaço. Não tem altura, largura ou espessura. 

O segundo ponto é que Jesus não se multiplica: não passa a haver muitos Jesus; também não se divide entre as diferentes hóstias. Há um só Jesus, completo e indiviso. A sua multilocação não é resultado de multiplicações e ou divisões, mas da suspensão da lei do espaço relativamente ao seu corpo sagrado. É como se estivesse num lugar, e todas as partes do espaço fossem atraídas para Ele. É fácil ver a razão pela qual a Eucaristia é chamada - e é - o sacramento da unidade. Quando comungamos - nós e os nossos companheiros de comunhão do mundo inteiro -, estamos onde Ele está. O espaço dissolveu-se para nós, e todos juntos somos um em Cristo. 

Quanto tempo permanece Jesus na Sagrada Eucaristia? O tempo em que permanecem as espécies do pão e do vinho. Se um fogo repentino destruísse as hóstia consagradas do sacrário, Jesus não se queimaria. As aparências do pão e do vinho transformar-se-iam em cinzas, mas Jesus já não estaria lá. Quando, depois de comungarmos, o nosso processo digestivo destrói as aparências do pão, Jesus já não permanece corporalmente em nós; só fica a sua graça. 

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A fé explicada - Padre Leo J. Trese. Ed.Quadrante, 14ª edição, 2014. 


 







sábado, 21 de junho de 2025

Eucaristia - Jesus mantém a sua promessa




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 Pe. Leo J. Trese

Na sinagoga de Cafarnaum, quase um ano antes da sua morte, Jesus prometeu dar o seu próprio corpo e o seu próprio sangue como alimento para a salvação dos homens. Na Última Ceia, nas vésperas da sua crucifixão, cumpriu a sua promessa. Legou à Igreja e a cada um dos seus membros, não terras, casas ou dinheiro, mas um legado como só Deus nos podia dar: o dom da sua própria Pessoa viva. 

No Novo Testamento, há quatro relatos da instituição da Eucaristia. São os de Mateus (26, 26-28), Marcos (14, 22-24), Lucas (22, 19-20) e Paulo (1 Cor 11, 23-29). São João, que é quem nos conta a promessa da Eucaristia, não se preocupa de repetir a história da instituição deste sacramento. Foi o último Apóstolo a escrever um Evangelho, e conhecia os outros relatos. Em seu lugar, decide transmitir-nos as belíssimas palavras finais de Jesus aos seus discípulos na Última Ceia. 

Eis aqui o relato da instituição da Sagrada Eucaristia segundo nos conta São Paulo: O Senhor Jesus, na noite em que foi entregue, tomou o pão e, dando graças, partiu-o e disse: Tomai e comei; isto é o meu corpo, que será entregue por vós; fazei isto em memória de mim. Igualmente também, depois de ter ceado, tomou o cálice e disse: Este cálice é o novo testamento no meu sangue; fazei isto em memória de mim todas as vezes que o beberdes. 

As suas palavras não podiam ser mais claras. "Isto" queria dizer "esta substância que tenho em minhas mãos e que agora que começo a falar é pão e ao terminar não será já pão, mas o meu próprio corpo". "Este cálice" queria dizer "este cálice que agora que começo a falar contém vinho, e ao terminar não será mais vinho, mas o meu próprio sangue". 

"Isto é o meu corpo" e "este cálice... é o meu sangue". Os Apóstolos tomaram as palavras de Jesus literalmente. Aceitaram como um fato (e que ato de fé, essa aceitação!) que a substância que ainda parecia pão era agora o Corpo de Jesus; e que a substância que continuava a parecer vinho era agora o Sangue de Cristo. 

Essa foi a doutrina que os Apóstolos pregaram à Igreja nascente. Essa foi a crença universal dos cristão durante mil anos. No século XI, um herege chamado Berengário pôs em dúvida a verdadeira da presença real, e ensinava que Jesus tinha falado apenas em sentido figurado e, assim, o pão e o vinho consagrados não eram realmente o seu corpo e o seu sangue. A heresia de Berengário foi condenada por três concílios, e Berengário retratou-se do seu erro e voltou ao redil. A doutrina da presença real permaneceu, indiscutida por outros quinhentos anos. 

No século XVI, chegaram Lutero e a reforma protestante. O próprio Lutero não negou inteiramente a presença real de Jesus na Eucaristia. Admitia que as palavras de Jesus eram demasiado terminantes para que fosse possível explicá-las de outro modo. Mas Lutero queria abolir a Missa, bem como a adoração de Jesus presente no altar. Por isso, tratou de resolver o seu dilema ensinando que, embora o pão continuasse a ser pão e o vinho, vinho, Jesus se faz presente juntamente com as substâncias do pão e do vinho; mas sustentava que Jesus está presente apenas no momento em que se recebe o pão e o vinho; não antes nem depois. 

Outros reformadores protestantes foram mais longe que Lutero e acabaram por negar complemente a presença real. Tanto eles como os teólogos protestantes que lhes sucederam sustentaram que, quando Jesus disse: "Isto é o meu corpo" e "Isto é o meu sangue", lançou mão de um recurso de linguagem, e que o que queria dizer era: "Isto representa o meu corpo" ou "Isto é um símbolo do meu sangue". Na sua tentativa de alterar as palavras de Cristo, tiveram que valer-se de todo o tipo de interpretações inverossímeis, mas deixaram sem respostas as razões realmente sólidas que provam que Jesus disse o que queria dizer e que quis dizer o que disse. 

A primeira delas reside na solenidade da ocasião: a noite anterior à sua morte. Nela, Jesus faz o seu testamento, deixa-nos a sua última vontade. Um testamento não é um documento apropriado para empregar uma linguagem figurada; mesmo nas circunstâncias mais favoráveis, os tabeliães têm, às vezes, dificuldade em interpretar as intenções do testador, quanto mais se este emprega uma linguagem simbólica. 

Mais ainda: sendo Deus, Jesus sabia que, em consequência das palavras que ia pronunciar naquela noite, milhões e milhões de pessoas lhe prestariam culto sob a aparência de pão. Se não tivesse querido estar realmente sob essas aparências, os adoradores prestariam culto a um simples pedaço de pão e incorreriam no pecado de idolatria, e isto, certamente, não é coisa a que o próprio Deus quisesse induzir-nos, preparando o cenário e utilizando obscuros modos de falar. 

Que os Apóstolos tomaram literalmente as palavras de Jesus é evidente, pois os cristãos creram os primórdios na presença real de Jesus na Eucaristia. De ninguém mais, além dos Apóstolos, poderiam ter obtido essa crença. E quem melhor do que este nos poderia ter perguntado a Jesus - e certamente o fizeram - todas as questões que lhes ocorressem sobre o significado das palavras que acabavam de ouvir. Às vezes, tendemos a esquecer que os Evangelhos registram apenas uma pequena parte do que se passou entre Jesus e os Apóstolos. Compilar três anos de diálogo, de perguntas e respostas, de ensinamentos, requereria um montão de livros.

Quando, na noite de Quinta-feira Santa, Jesus pronunciou as palavras: "Isto é o meu corpo" sobre o pão, e "Isto é o meu sangue" sobre o vinho, os Apóstolo tomaram essas palavras ao pé da letra, como se prova claramente pela sua conduta posterior. Se Jesus lançou mão de uma metáfora, se o que na realidade quis dizer era: "Este pão é como que um símbolo do meu corpo e este vinho significa o meu sangue; portanto, cada vez que os meus seguidores se reunirem e participarem de um pão e um vinho como estes, honrar-me-ão e representarão a minha morte"; se foi o que Jesus quis dizer, então todos os Apóstolos o entenderam mal. E, através da sua interpretação errônea, toda a cristandade - até que chegaram os protestantes - passou a adorar um pedaço de pão como se fosse Deus. 

É totalmente insensato pensar que Jesus pudesse permitir que os seus discípulos caíssem num erro tão grave. Em outras ocasiões, em muitíssimas outras ocasiões, e tratando-se de matérias muito menos importantes que esta, Jesus corrige os seus Apóstolos quando o interpretam mal. Para citar um só exemplo no Evangelho de São Mateus (16, 6-12), Jesus diz aos seus Apóstolos que estejam prevenidos contra o fermento dos fariseus e dos saduceus. Eles pensam que lhes está falando de pão real, e cochicham entre si que não têm pão. Pacientemente, Jesus esclarece-lhes que se refere aos ensinamentos dos fariseus e saduceus, não ao pão que se come. Em outras ocasiões, quando Jesus se serve de metáforas, o próprio escritor sagrado nos esclarece o respectivo significado, como na ocasião em que Jesus disse: Destruí este tempo e eu o reedificarei em três dias, e João explica imediatamente que Ele se referia ao templo do seu corpo (cf. Jo 2, 19-22). Encontramos incidentes parecidos em grande abundância nos Evangelhos, e, no entanto, querem agora fazer-nos crer que, no momento solene da Última Ceia, Jesus utilizou modos de dizer novos e estranhos, sem se darem ao trabalho de explicar qual era o seu signficado. 

Porque são modos de dizer novos e estranhos. Nem o pão é um símbolo natural do corpo humano, nem o vinho um símbolo do sangue. Se alguém cortasse uma fatia de pão e a oferecesse a outro comensal, dizendo-lhe: "Isto é o meu corpo", este pensaria logo que estava diante de um gozador ou de um louco varrido. E é blasfemo tratar de aplicar a Jesus qualquer das duas hipóteses.

Como recurso literário, só é válido lançar mão de um modo de dizer quando o seu significado é claro. Esta clareza pode resultar da natureza da afirmação, como quando mostro uma fotografia e digo: "É a minha mãe", ou aponto um menino irrequieto e digo: "É uma máquina de movimento contínuo", ou digo de um cavalo veloz: "É um raio"; ou quando me ponho a explicar o sentido da metáfora; por exemplo, quando coloco uns fósforos sobre a mesa e digo: "Esta é a minha casa, e aqui está a sala de jantar". Mas, nem pela natureza da afirmação, nem por explicações dadas, as palavras "Isto é o meu corpo" fazem sentido como metáfora. 

A ideia de que Jesus teria falado em metáforas na Última Ceia torna-se ainda mais incrível se tivermos em conta que se dirigia a homens que, na sua maioria, eram uns pobres e incultos pescadores. Não tinham sido educados nas sutilezas da retórica. Mais ainda, antes de o Espírito Santo ter descido sobre eles, assombram-nos pelo seu lento entendimento das coisas. Temos um exemplo na passagem da ressurreição de Lázaro. Lemos em São João (11, 11-14) que, quando Jesus disse: O nosso amigo Lázaro dorme, mas vou despertá-lo, os discípulos replicaram: Senhor, se dorme, curar-se-á. Então Jesus disse-lhes claramente: Lázaro morreu. Eram mentalidades difíceis para lhes falar em metáforas!

Outra indicação de que Jesus não falava em metáforas ao instruir a Eucaristia, achamo-la nas palavras com que São Paulo conclui o seu relato da Última Ceia (1Cor 11, 27-30): Portanto, todo aquele que comer deste pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, a si mesmo o homem, e assim coma deste pão e beba do cálice, porque aquele que o come e bebe indignamente, come e bebe para si a condenação, não distinguindo o corpo do Senhor. É duro dizer que um homem se torna réu do Corpo e do Sangue do Senhor, que come e bebe a sua própria condenação, se o pão não é mais do que pão, mesmo que seja pão bento, e o vinho não é senão vinho, mesmo que seja vinho sobre o qual se tenham pronunciado umas orações. 

Nós, certamente, não necessitamos de provas como as que aqui se esquematizaram para crer na presença real de Jesus Cristo na Sagrada Eucaristia. Cremos nessa verdade não por provas racionais, mas, primordialmente, porque a Igreja de Cristo, que não pode errar em matérias de fé e moral, assim no-lo diz. Mas sempre é útil conhecer as dificuldades com que tropeçam os que procuram interpretações pessoais nas palavras de Nosso Senhor. 

Nós preferimos seguir a regra da sensatez que diz que, para conhecer o significado de uma coisa que se disse, não há melhor caminho do que perguntar a quem a ouviu ou que estava lá. Os Apóstolos estavam lá; os primeiros cristãos, os que escutaram a pregação dos Apóstolos, em certo sentido estavam lá. Mesmo nós, que herdamos uma tradição ininterrupta, em certo sentido estávamos lá. Independentemente de ser um dogma definido pela Igreja, preferimos crer nos ensinamentos dos Apóstolos e na crença unânime dos cristãos durante mil e quinhentos anos, em vez de prestar ouvidos aos ensimentos desencontrados dos reformadores protestantes. Homens como Lutero, Karlstadt, Zwingli ou Calvino exigem demasiado quando nos pedem para crer que durante quinze séculos os cristãos permaneceram no erro e que, de repente, eles, os reformadores protestantes, encontraram a resposta certa. 

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A fé explicada - Padre Leo J. Trese. Ed.Quadrante, 14ª edição, 2014. 








quinta-feira, 19 de junho de 2025

Eucaristia - O maior dos sacramentos



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 Leo J. Trese


Agora que nos dispomos a estudar o sacramento da Sagrada Eucaristia, vamos passar por uma situação semelhante à do viajante que torna a percorrer uma região bem conhecida. Encontraremos muitas paisagens familiares - neste caso, verdades já vistas anteriormente. Mas, nas verdades que vamos recordar, confiamos em que haveremos de notar aspectos de interesse que antes nos passaram despercebidos. Podemos também confiar em descobrir outras paisagens - outras verdades - que escaparam totalmente à nossa observação em viagens anteriores por essa região amada e familiar, que é o tema do maior dos sacramentos. 

Quando dizemos que a Sagrada Eucaristia é o maior dos sacramentos, afirmamos algo evidente. O Batismo é, sem dúvida, o sacramento mais necessário; sem ele, não podemos ir para o céu. No entanto, apesar das maravilhas que o Batismo e os outros cinco sacramentos produzem na alma, não são senão instrumentos de que Deus se serve para nos dar a sua graça; mas na Sagrada Eucaristia não temos apenas um instrumento que nos comunica as graças divinas: é-nos dado o próprio Dador da graça, Jesus Cristo Nosso Senhor, real e verdadeiramente presente. 

"A Eucaristia é <<fonte e centro de toda a vida cristã>> (LG 11). <<Os restantes sacramentos, porém, assim como todos os ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam. Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, nossa Páscoa>> (PO 5)" (n. 1324).

 O sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo tem tido muitos nomes ao longo da história cristã: Pão dos Anjos, Ceia do Senhor, Sacramento do altar e outros que nos são bem conhecidos. Mas o nome que permaneceu desde o princípio, o nome que a Igreja dá oficialmente a este sacramento é Sagrada Eucaristia. Provém do Novo Testamento. Os quatro escritores sagrados - Mateus, Marcos, Lucas e Paulo - que nos narram a Última Ceia, dizem-nos que Jesus tomou o pão e o vinho em suas mãos e deu graças". E assim, da palavra grega eucharistia, que significa "ação de graças", resultou o nome do nosso sacramento: Sagrada Eucaristia. 

O Catecismo ensina-nos que a Eucaristia é ao mesmo tempo sacrifício e sacramento. Como sacrifício, a Eucaristia é a Missa, a ação divina em que Jesus, por meio de um sacerdote humano, transforma o pão e o vinho no seu próprio corpo e sangue e continua no tempo o oferecimento que fez a Deus no Calvário, o oferecimento de Si próprio em favor dos homens. 

"A sagrada Eucaristia completa a iniciação cristã. Aqueles que foram elevados à dignidade do sacerdócio real pelo Batismo e configurados mais perfeitamente a Cristo pela Confirmação, esses, por meio da Eucaristia, participam, com toda a comunidade, no próprio sacrifício do Senhor. [...] A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, a atualização e oferecimento sacramental do seu único sacrifício, na Liturgia do Igreja que é o seu Corpo" (ns. 1322 e 1362). 

O sacramento da Sagrada Eucaristia adquire o seu ser (ou é "confeccionado", como dizem os teólogos) na Consagração da Missa; nesse momento, Jesus torna-se presente sob as aparências do pão e do vinho. E enquanto essas aparências permanecerem, Jesus continua a estar presente e o sacramento da Sagrada Eucaristia continua a existir nelas. O ato pelo qual se recebe a Sagrada Eucaristia chama-se Sagrada Comunhão. Podemos dizer que a Missa é a "confecção" da Sagrada Eucaristia e que a comunhão é a sua recepção. Entre uma e outra, o sacramento continua a existir (como no sacrário), quer o recebamos, quer não. 

Ao tratarmos de aprofundar no conhecimento deste sacramento, não temos melhor maneira de fazê-lo do que começando por onde Jesus começou: por aquele dia na cidade de Cafarnaum em que fez a mais incrível das promessas, a de dar a sua carne e o seu sangue como alimento da nossa alma.  

"Os milagres da multiplicação dos pães - quando o Senhor disse a bênção, partiu e distribuiu os pães pelos seus discípulos para alimentar a multidão -, prefiguram a superabundância deste pão único da Sua Eucaristia" (n. 1335).

Na véspera, Jesus tinha lançado os alicerces da sua promessa. Sabendo que ia fazer uma tremenda exigência à fé dos seus ouvintes, preparou-os para ela. Sentado numa ladeira, do outro lado do mar de Tiberíades, tinha pregado a uma grande multidão que o havia seguido até ali, e agora, já ao cair da tarde, prepara-se para despedi-los. Mas, movido de compaixão e como preparação para a sua promessa do dia seguinte, faz o milagre dos pães e dos peixes. Alimenta a multidão - só os homem eram cinco mil - com cinco pães e dois peixes; e, depois de todos se terem saciado, os seus discípulos recolhem doze cestos de sobra. Esse milagre haveria de estar presente no dia seguinte (ou deveria estar) na mente dos que o escutaram. 

Tendo despedido os que o tinham seguido, subiu monte acima, a fim de orar em solidão como era seu costume. Mas não era muito fácil separar-se daquela multidão, que queria ver mais milagres e ouvir mais palavras de sabedoria de Jesus de Nazaré: acamparam por ali para passar a noite e viram os discípulos embarcar (sem Jesus) rumo a Carfanaum, na única barca que havia. Nessa noite, depois de terminar a oração, Jesus atravessou andando as águas tomentosas do lago e juntou-se aos seus discípulos na barca, e assim chegou com eles a Cafarnaum. 

Na manhã seguinte, a turba não conseguia encontrar Jesus. Quando chegaram outras barcas de Tiberíades, desistiriram de procurá-lo e embarcaram para Carfanaum. Qual não foi o seu assombro ao encontrarem de novo Jesus, que havia chegado antes deles, sem ter subido à barca que partira na noite anterior! Foi outro portento, outro milagre que Jesus fez para fortalecer a fé daquela gente (e dos discípulos), pois ia pô-la à prova pouco depois. 

Os discípulos e os que conseguiram entrar aglomeraram-se em seu redor na sinagoga de Carfanaum. Foi ali e então que Jesus fez a promessa que hoje nos enche de fortaleza e vida: prometeu a sua Carne e o seu Sangue como alimento; prometeu a Sagrada Eucaristia. 

Se tinha poder para multiplicar cinco pães e com eles alimentar cinco mil homens, como não havia de tê-lo para alimentar toda a humanidade com um pão celestial feito por Ele?! Se tinha poder para andar sobre as águas como se fosse terra firme, como não havia de tê-lo para ordenar aos elementos do pão e do vinho que lhe emprestassem a sua aparência e para utilizá-la como capa para a sua Pessoa? Jesus tinha preparado bem os seus ouvintes e, como veremos, eles tinham necessidade disso. 

Se você tem um exemplar do Novo Testamento à mão, será muito bom que leia inteiro o capítulo sexto do Evangelho de São João. Só assim poderá captar todo o ambiente, as circunstâncias e o desenrolar dos acontecimentos na sinagoga de Carfanaum. Vou citar somente as linhas mais pertinentes, que começam no versículo 51 e acabam no 67. 

Disse Jesus: Eu sou o pão vivo que desceu do céu. [...] Quem comer deste pão viverá eternamente; e o pão que eu darei é a minha carne para a salvação do mundo. Disputavam, pois, entre si os judeus, dizendo: Como pode este dar-nos a comer a sua carne? Jesus disse-lhes: Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. O que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne é verdadeiramente comida e o meu sangue é verdadeiramente bebida. [...] Este é o pão que desceu do céu. Não é como o pão que comeram os vossos pais e morreram. O que come deste pão viverá eternamente [...]. Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isso, disseram: Dura é esta linguagem, e quem a pode ouvir? Jesus, conhecendo em si mesmo que os seus discípulos murmuravam por isso, disse-lhes: [...] As palavras que eu vos disse são espírito e vida. Mas há alguns de vós que não crêem [...] Desde então, muitos dos seus discípulos tornaram atrás e já não andavam com ele. 

 Este breve extrato da capítulo sexto de São João contém os dois pontos que mais nos interessam agora: os dois pontos que nos dizem, meses antes da Última Ceia, que na Sagrada Eucaristia estarão presentes o verdadeiro Corpo e o verdadeiro Sangue de Jesus. Lutero rejeitou a doutrina da presença verdadeira e substancial de Jesus na Eucaristia, doutrina que havia sido seguida firmemente por todos os cristãos durante mil e quinhentos anos. Lutero aceitava certa espécie de presença de Cristo, ao menos no momento em que se recebesse a comunhão. Mas no terreno adubado por Lutero brotaram outras confissões protestantes que foram recusando mais e mais a crença na presença real. Na maioria das confissões protestantes de hoje, o "serviço da comunhão" não passa de um simples rito comemorativo da morte do Senhor; o pão continua a ser pão e o vinho continua a ser vinho. 

Nos seus esforços por eludir a doutrina da presença real, teólogos protestantes procuraram mitigar as palavras de Jesus, afirmando que Ele não pretendia que as tomassem no seu sentido literal, mas apenas espiritual ou simbolicamente. Mas é evidente que não se podem diluir as palavras de Cristo sem violentar o seu sentido claro e rotundo. Jesus não poderia ter sido mais enfático: A minha carne é verdadeiramente comida e o meu sangue é verdadeiramente bebida. Não há forma de dizê-lo com mais clareza. No original grego, que é a língua em que São João escreveu o seu Evangelho, a palavra do versículo 55 que traduzimos por "comer" estaria mais próxima do seu sentido original se a traduzíssemos por "mastigar" ou "comer mastigando". 

Tentar explicar as palavras de Jesus como simples modo de expressar-se levar-nos-ia a outro beco sem saída. Entre os judeus, que eram aqueles a quem Jesus se dirigia, a única ocasião em que a frase "comer a carne de alguém" se utilizava figurativamente era para significar ódio a determinada pessoa ou perseguir alguém com furor. De modo parecido, "beber o sangue de alguém" queria indicar que esse alguém seria castigado com penas severas. Nenhum desses significados - os únicos que os judeus conheciam - se revela coerente se os aplicarmos às palavras de Jesus. 

Outra prova de peso, que confirma que Jesus quis verdadeiramente dizer o que disse - que o seu corpo e o seu sangue estariam realmente presentes na Eucaristia - está em que alguns dos seus discípulos o abandonaram por terem achado a ideia de comê-lo demasiado repulsiva. Não tiveram fé suficiente para compreender que, se Jesus lhes ia dar a sua Carne e o seu Sangue em alimento, o faria de forma a não causar repugnância à natureza humana. Por isso o abandonaram, "e já não andavam com ele". 

"O primeiro anúncio da Eucaristia dividiu os discípulos, tal como o anúncio da Paixão os escandalizou: Estas palavras são insuportáveis! Quem as pode escutar? (Jo 6,60). A Eucaristia e a Cruz são pedras de tropeço. É o mesmo mistério e continua a ser motivo de divisão. Também vós quereis ir-vos embora? (Jo 6,67). Esta pergunta do Senhor ecoa através dos tempos, como convite do seu amor a que descubramos que só Ele tem palavras de vida eterna (Jo 6,68) e que acolher na fé o dom da sua Eucaristia é acolhê-lo a Ele mesmo" (n. 1336). 

Jesus nunca os teria deixado ir-se embora se essa deserção fosse simples resultado de um mal-entendido. Muitas vezes antes tinha-se dado ao trabalho de esclarecer as suas palavras quando eram mal compreendidas. Por exemplo, quando disse a Nicodemos que era preciso nascer de novo, e este lhe perguntou como é que um adulto podia entrar de novo no ventre de sua mãe (cf. Jo 3,3 e segs.); pacientemente, Jesus esclareceu-lhes as suas palavras sobre o Batismo. Mas agora, em Carfanaum, Jesus não esboça o menor gesto para impedir que os seus discípulos o abandonem nem para lhes dizer  que o haviam entendido mal. Não pode fazê-lo pela simples razão de que o tinham entendido perfeitamente e por isso o deixaram. O que lhes faltou foi fé, e Jesus, tristemente, teve que resignar-se a vê-los partir. 

 Tudo isto faz com que a afirmação da doutrina da presença real esteja ineludivelmente contida na promessa de Cristo, porque, se não fosse assim, as suas palavras não teriam sentido, e Jesus não falava por enigmas indecifráveis. 

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A fé explicada - Padre Leo J. Trese. Ed.Quadrante, 14ª edição, 2014. 

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domingo, 15 de junho de 2025

Vaidade do mundo




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Deus abençoe por Maria! 


Santo Afonso Mª de Ligório 

Quid prodest homini si mundum universum lucretur, animae vero suae detrimentum patiatur? 

Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder sua alma? (Mt 16,26).


PONTO I 

Numa viagem marítima, um filósofo antigo, de nome Aristipo, naufragou com o navio em que ia, perdendo todos os bens. Pôde, entretanto, chegar salvo à terra, e os habitantes do país a que arribou, entre os quais Aristipo gozava de grande fama por seu saber, o indenizaram de tudo que havia perdido. Admirado, escreveu logo a seus amigos e patrícios incitando-os a que aproveitassem o seu exemplo, e que somente se premunissem das riquezas que nem com os naufrágios se podem perder. É isto exatamente o que nos recomendam nossos parentes e amigos que já chegaram à eternidade. Advertem-nos para que este mundo procuremos adquirir antes de tudo os bens que nem a morte nos faz perder. O dia da morte é chamado o dia da perda, porque nele perdemos as honras, as riquezas e os prazeres, enfim, todos os bens terrenos. Por esta razão, diz Santo Ambrósio, que não podemos chamar nossos a esses bens, porque os não podemos levar conosco para o outro mundo; somente as virtudes nos acompanham para a eternidade. 

"De que serve, pois - diz Jesus Cristo (Mt 16,26) - ganhar o mundo inteiro, se à hora da morte, perdendo a alma, tudo perde?"... Oh! quantos jovens, penetrados desta grande máxima, resolveram entrar na clausura! Quantos anacoretas conduziu ao deserto! A quantos mártires moveu a dar a vida por Cristo! Por meio desta máximas soube Santo Inácio de Loiola chamar para Deus inúmeras almas, entre elas a alma formosíssima de São Francisco Xavier, que, residindo em Paris, ali se ocupava em pensamentos mundanos. "Pensa, Francisco - lhe disse um dia o Santo, - pensa que o mundo é traidor, que promete e não cumpre; mas, ainda que cumprisse o que promete, jamais poderia satisfazer teu coração. E supondo que o satisfizesse, quanto tempo poderá durar essa felicidade? Mais que tua vida? E no fim dela, levarás tua dita para a eternidade? Existe, porventura, algum poderoso que tenha levado para o outro mundo uma moeda sequer ou um criado para seu serviço? Há algum rei que tenha levado consigo um pedaço de púrpura em sinal de dignidade?..." Movido por estas considerações, São Francisco Xavier renunciou ao mundo, seguiu a Santo Inácio de Loiola e se tornou um grande Santo.

Vaidades das vaidades (Ecl 1,2). Assim chamou Salomão aos bens do mundo, depois de ter experimentado, como ele mesmo confessou, todos os prazeres da terra (Ecl 2,10). Soror Margarida de Sant'Ana, carmelita descalça, filha do imperador Rodolfo II, dizia: "Para que servem os tronos da hora da morte?..." Coisa admirável! Tremem os Santos ao pensar em sua salvação eterna. Tremia o Padre Ségneri, que, todo assustado, perguntava a seu confessor: "Que me dizeis, Padre, salvar-me-ei?" Tremia Santo André Avelino quando, gemendo, exclamava: "Quem sabe se me salvarei!" Esse mesmo pensamento afligia a São Luís Bertram, e o fez levantar-se muitas noites do leito, exclamando: "Quem sabe se me condenarei?..." E contudo os pecadores vivem em estado de condenação, e dormem, e riem, e se divertem!


AFETOS E SÚPLICAS

Ah! Jesus, meu Redentor! De todo o coração vos agradeço por me terdes dado a conhecer minha insensatez e o mal que cometi afastando-me de vós, que por mim sacrificastes sangue e vida. Em verdade, não merecíeis da minha parte ser tratado como vos tratei. Se a morte me ferisse agora, que acharia em mim senão pecados e remorsos de consciência, que me tornariam bem angustiosos os últimos momentos? Confesso, meu Salvador, que fiz mal, que a mim mesmo me enganei, trocando o Bem Supremo pelos míseros prazeres deste mundo. 

Arrependo-me de todo o coração, e vos suplico, pelas dores que na cruz sofretes, me deis a mim tão grande dor de meus pecados, que me faça chorar durante o resto de minha vida as culpas que cometi. 

Perdoai-me, meu Jesus; prometo nunca mais vos ofender, e amar-vos sempre. Sei que não sou digno de vosso amor, porque o desprezei tantas vezes; mas também sei que amais a quem vos ama... (Pr 8,17). 

Amo-vos, Senhor; amai-me, pois, também. Não quero tornar a perder vossa amizade e graça. Renuncio a todos os prazeres e a todas as pompas deste mundo, contanto que me ameis... Ouvi-me, meu Deus, por amor de Jesus Cristo, que vos pede não me arrojeis de vosso coração. 

A vós me ofereço inteiramente e vos consagro minha vida, meus sentidos, minha alma, meu corpo, minha vontade e minha liberdade. 

Aceitai, Senhor, a oferta e não me desprezeis como mereço, por ter desprezado tantas vezes vosso amor... (Sl 50,13).

Virgem Santíssima, minha Mãe, rogai por mim a Jesus. Em vossa intercessão confio. 


PONTO II

É mister pesar os bens na balança de Deus e não na do mundo, que é falsa e enganadora (Os 12,71). Os bens do mundo são desprezíveis, não satisfazem e acabam depressa. "Meus dias passaram mais depressa que um correio; passaram como um navio..." (Jo 9,25-26). 

Passam e fogem velozes os breves dias desta vida; e que resta por fim dos prazeres terrenos? Passaram como navios. O navio não deixa vestígio de sua passagem (Sb 5,10). Perguntemos a todos esses ricos, sábios, príncipes, imperadores, que estão na eternidade, o que acham ali de suas passadas grandezas, pompas e delícias deste mundo. Todos responderão: Nada, nada. Ó homens, exclama Santo Agostinho, vós considerais somente os bens que possui aquele magnata; atentai também nas coisas que leva consigo ao sepulcro: um cadáver pestilento e uma mortalha que com ele se consumirá. Quando morre algum dos grandes, apenas se fala dele algum tempo; depois até sua memória se perde (Sl 9,7). E se caem no inferno, que farão e que dirão ali?... Chorarão, dizendo: Para que nos serviram o luxo e a riqueza? Tudo agora se passou como sombra (Sb 5,8-9) e nada nos resta senão penas, pranto e desespero sem fim. 

"Os filhos do século são mais prudentes em seus negócios que os filhos da luz" (Lc 18,8). Causa pasmo ver quão prudentes são os mundanos no que diz respeito às coisas da terra. Que passos não dão para adquirir honras ou fortuna! Quantos cuidados para conservar a saúde do corpo!... Escolhem e empregam os meios mais adequados, os médicos mais afamados, os melhores remédios, o clima mais saudável... e, entretanto, quão descuidados são para a alma!... E, no entanto, é certo que a saúde, as honrarias e as riquezas devem acabar-se um dia,  ao passo que a alma, imortal, não tem fim. "Observemos - disse Santo Agostinho - quanto sofre o homem pelas coisas que ama desordenadamente". Quanto não sofrem os vingativos, ladrões e licenciosos para atingir seus malvados desígnios? E para o bem da alma nada querem sofrer. Ó Deus! À luz do círio que na hora da morte se acende, naquele momento de grandes verdades, os mundanos reconhecem e confessam sua grande loucura. Então desejariam ter renunciado ao mundo e levado vida santa. 

Ó Pontífice Leão XI disse na hora da morte: "Em vez de ser Papa, melhor fora para mim ter sido porteiro no meu convento". Honório III, também Pontífice, exclamou ao morrer: "Melhor teria feito, se ficasse na cozinha de minha comunidade para lavar a louça". Filipe II, rei de Espanha, chamou seu filho na hora da morte, e, depois de afastar a roupa, lhe mostrou o peito roído de vermes, dizendo: "Vê, príncipe, como se morre, e como se acabam as grandezas do mundo". Depois exclamou: "Por que não fui eu, em vez de monarca, simples frade leigo de qualquer ordem!" Mandou depois que lhe pusessem ao pescoço uma cruz de madeira; e tendo disposto todas as coisas para sua morte, disse a seu herdeiro: Quis, meu filho, que estivesses presente a este ato, para que visses como, no fim da vida, o mundo trata ainda os próprios reis. Sua morte é igual à dos mais pobres da terra. Aquele que melhor tiver vivido, esse é que achará junto de Deus mais alto favor". E este mesmo filho, que foi depois Filipe III, ao morrer com apenas 43 anos de idade, disse: "Atendei, meus súditos, a que no meu necrológio somente se fale do espetáculo que tendes presente. Dizei que na morte de nada serve o título de rei, a não ser para sentir-se maior tormento de o haver sido... Oxalá, em vez de rei, tivesse vivido em um deserto servindo a Deus!... Ir-me-ia agora apresentar com mais confiança entre seu tribunal, e não correria tamanho risco de me condenar!..." De que valem, porém, tais desejos no transe da morte, senão para maior desespero e pena de quem não amou a Deus durante a vida? Dizia, por isto, Santa Teresa: "Não se deve fazer caso das coisas que acabam com a vida. A verdadeira vida consiste em viver de modo que nada se tenha a recear da morte..." Portanto, se desejamos compreender o que valem os bens da terra, consideremo-los do leito da morte e digamos logo: Aquelas riquezas, estas honras, estes prazeres, se acabarão um dia. É necessário, assim, que procuremos santificar-nos e enriquecer-nos somente dos bens únicos que hão de acompanhar-nos sempre e que constituirão nossa dita por toda a eternidade.


AFETOS E SÚPLICAS

Ah, meu Redentor!... Sofrestes tantos sacrifícios e tantas ignomínias por meu amor, e eu amei tanto os prazeres e as vaidades do mundo, que por sua causa fui levado a calcar aos pés inúmeras vezes a vossa graça. Mas, ainda que vos desprezasse, não deixáveis de me procurar; por isso, ó meu Jesus, não posso temer que me abandonareis agora que vos procuro e amo de todo o coração, e me dói mais de vos ter ofendido que se tivesse sofrido qualquer outro mal. Ó Deus de minha alma, não quero tornar a ofender-vos nem nas coisas mínimas. 

Fazei-me conhecer aquilo que vos desagrada e que não o pratique por nada deste mundo. Fazei que saiba o que vos é agradável e o ponha em execução. Quero amar-vos verdadeiramente; e por vós, Senhor, aceitarei gostosamente todos os sofrimentos e todas as cruzes que me vierem. Dai-me a resignação de que necessito. Queimai, cortai... Castigai-me nesta vida, a fim de que na outra possa amar-vos eternamente. 

Maria, minha Mãe, a vós me recomendo; não deixeis de rogar a Jesus por mim. 


PONTO III

"O tempo é breve... os que se servem do mundo, sejam como se dele não se servissem, porque a figura deste mundo passa..." (1Cor 7,31). Que é com efeito nossa vida temporal senão uma cena que passa e se acaba logo? "Passa a figura deste mundo", quer dizer, a aparência, a cena de comédia. "O mundo é como um teatro - diz Cornélio a Lápide; - desaparece uma geração e outra lhe sucede. Quem representou o papel de rei, não levará consigo a púrpura... dize-me, ó cidade, ó casa, quantos donos tivestes?" Quando acaba a peça, o rei deixa de ser rei, o senhor deixa de ser senhor. Possuis agora essa quinta ou palácio; mas virá a morte e outros passarão a ser donos de tudo. 

A hora da morte faz esquecer todas as grandezas, honras e vaidades do mundo (Ecl 11,29). Casimiro, rei da Polônia, morreu de repente, quando, achando-se à mesa com grandes do reino, levava aos lábios a taça para beber. Rapidamente acabou para ele a cena do mundo... O imperador Celso foi assassinado oito dias depois de ter sido elevado ao trono, e assim acabou para Celso a peça da vida. Ladislau, rei da Boêmia, jovem de dezoito anos, esperava a sua esposa, filha do rei da França, e lhe preparava grandes festejos, quando certa manhã o acometeu dor veementíssima da qual caiu fuminando. Expediram-se imediatamente correios, advertindo a esposa que voltasse para a França, porque para Ladislau o drama do mundo já tinha acabado... Este pensamento da vaidade do mundo fez santo a Francisco de Borja que (como em outro lugar dissemos), ao ver o cadáver da imperatriz Isabel, falecida no meio das grandezas e na flor da idade, resolveu entregar-se inteiramente a Deus, dizendo: "Assim acabam as grandezas e coroas do mundo?... Não quero servir a senhor que me possa ser roubado pela morte". 

Procuremos, pois, viver de maneira que à hora de nossa morte não se nos possa dizer o que se disse ao néscio mencionado no Evangelho: "Insensato, nesta noite hão de exigir de ti a entrega de tua alma; e as coisas que juntastes, para quem serão? (Lc 12,20).  E logo acrescenta São Lucas: Assim é que sucede a quem enriquece para si, e não é rico aos olhos de Deus (Lc 12,21). Mais adiante se diz: Procurai entesourar para o céu, onde não chegam os ladrões nem rói a traça" (Mt 6,20); ou seja; procurai enriquecer, não com os bens do mundo, senão de Deus, com virtudes e merecimentos que estarão convosco eternamente no céu. Façamos, pois, todo o esforço, para adquirir o grande tesouro do amor divino. "Que possui o rico, se não tem caridade? E se o pobre tem caridade, que não possui?" - diz Santo Agostinho. - Quem possui todas as riquezas, mas não possui a Deus, é o mais pobre do mundo. Mas o pobre que possui a Deus possui tudo... E quem é que possui a Deus? Aquele que o ama. "Quem permanece na caridade, em Deus permanece, e Deus nele" (Mt 4,16).


AFETOS E SÚPLICAS

Meu Deus, não quero que o demônio volte a reinar na minha alma, mas que vós sejais meu único dono e senhor... Quero renunciar a tudo para alcançar vossa graça, que prefiro a mil coroas e mil reinos. E a quem deveria amar senão a vós, amabilidade infinita, bem infinito, beleza, bondade, amor infinitos? Na vida passada, enjeitei-vos pelas criaturas e isto será sempre para mim profunda dor que me atravessará o coração por vos ter ofendido, que tanto me tendes amado. Mas já que me haveis atraído com vossa graça, espero que não hei de ver-me privado novamente de vosso amor. Tomai, ó meu Amor, toda a minha vontade e tudo o que me pertence e fazei de mim o que vos aprouver. Peço-vos perdão por minhas culpas e desordens passadas. Nunca mais me queixarei das disposições da vossa providência, porque sei que todas elas são santas e ordenadas para meu bem. Fazei, pois, meu Deus, o que quiserdes, e eu vos prometo aceitar com alegria, e dar-vos graças... 

Fazei que vos ame, e nada mais pedirei... Basta de riquezas, basta de honras, basta de mundo. A meu Deus, só a meu Deus quero.

E vós, bem-aventurada Virgem Maria, modelo de amor de Deus, alcançai-me que, ao menos no resto de minha vida, vos acompanhe nesse amor. É em vós, Senhora, que confio. 

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Santo Afonso Mª de Ligório - Preparação para a morte









 

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Santo Antônio - Martelo dos Hereges

 



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Deus abençoe por Maria!


Antônio, a despeito da nova tarefa, não abandonou o ministério da pregação. A carreira do ensino, que ainda apenas se abria diante dele, ia fechar-se logo depois; ela foi em sua vida só um curto parêntesis. Sua verdadeira vocação era o apostolado; salvo, porém, que exigindo-o as circunstâncias, ele era de estatura para conduzir qualquer empresa. 

Em 1224, pregou a quaresma em Vercelli. Esta missão lhe fora oferecida pelo bispo Hugo, que governava a diocese; desempenhou-a com o zelo de costume, e os resultados excederam a expectativa. Segundo o testemunho dos historiadores, a igreja de Sto. Eusébio, cujas proporções eram consideráveis, não estava um instante vazia: noite e dia o povo se aglomerava, impaciente de ouvir a palavra do homem apostólico que a Providência lhe tinha enviado. Um acontecimento extraordinário veio ainda aumentar o movimento de conversão que a graça havia produzido. Uma manhã, quando o infatigável missionário pregava diante de numerosa assistência, ouviram-se soluços e gritos dilacerantes que partiam de uma das capelas laterais da basílicas: celebravam-se os funerais de um jovem que a morte roubara à ternura da família. Os parentes e os amigos, tomados de viva dor, banhavam de lágrimas o caixão, lamentando a perda sofrida. A cena comoveu os presentes, e o logo ressoaram na igreja exclamações tristes e gemidos que saíam de todos os peitos. Antônio participou da comoção geral, e interrompeu o seu discurso. Levantou os olhos para o céu, e pareceu como que absorto em ardente oração. Quando retomou a palavra, foi para se dirigir ao morto, que ia se enterrar: ordenou-lhe em nome de Jesus Cristo, que tinha ressuscitado o filho da viúva de Naim, que voltasse à vida e saísse do seu caixão. À voz do apóstolo, que já não estava só na estreia do ofício de milagreiro, o moço ergue-se, e caminhou radiante de saúde, à frente de sua família, transportada de assombro e de felicidade. O efeito deste prodígio foi imenso: renderam-se logo a Deus solenes ações de graças. Porém, o lucro o qual, desde esse momento, o custo pôde bastar para a tarefa; tão abundante se tornou a messe. 

Depois do primeiro Capítulo geral da Ordem, em 1216, S. Francisco havia estabelecido a missão de França. 

Em 1224, o seu fundador sempre inspirado por Deus, se decidiu a lá enviar Antônio, "a pérola de sua Ordem".

A escolha de um tal obreiro explica-se pelo deplorável estado a que se achavam reduzidas as províncias meridionais desse país. Meu assunto leva-me a traçar disto um rápido esboço. 

Desde cem anos, a heresia parecia ter-se naturalizado na região que se estende dos Alpes ao Garona e dos Prineus às montanhas do Auvergne. Quando ela em algum lugar sucumbia, era para em breve renascer sob outra forma, conservando a mesma índole. Na primeira metade do século XII, Pedro de Bruys, e seu discípulo Henrique, ambos monges que abandonaram a religião, agitaram o Delfinado e o Languedoc. Engêncio III enviou S. Bernardo para combater estes inimigos da fé e da paz pública. O abade de Claraval descarregou sobre eles duros golpes a que não haviam de sobreviver. Os Valdenses tomavam-lhes o lugar. Herdaram estes algumas de suas ideias, e sobretudo o seu fanatismo, continuando, ainda em maior escala, as devastações que eles tinham começado. Foram, porém, atacados com vigor; e, quando, esmagados pelo número, se recolheram às montanhas das Cévennes e do Piemonte, os Albigenses ocuparam o primeiro plano da cena. 

Os Albigenses eram a expressão mais completa dos erros que as seitas precedentes arrastavam como um barro impuro. À maneira de todas as escolas pagãs ou anticristãs, eles tinham duas doutrinas: uma doutrina metafísicas, professada em segredo por um número pequeno de iniciados; e uma doutrina popular, destinada aos simples e aos ignorantes. Sua metafísica não era outra coisa mais do que o maniqueísmo, velha heresia que havia atravessado os século no estado de sociedade secreta, para ela o único meio de escapar às sanções da opinião humana; e que aparecia aqui e ali a grandes intervalos como esses monstros que seguem no fundo do oceano caminhos ignorados, e que às vezes levantam a sua cabeça secular acima das ondas.  A doutrina popular consistia em recusar o batismo às crianças antes da idade da razão; em não permitir nem altares nem igrejas; em proibir adorar-se a cruz, e obrigar a celebração da missa; enfim, em rejeitar as orações e as boas obras pelos mortos. 

A moral dos Albigenses era conforme o seu símbolo. Partindo da ideia de que o mal é eterno como Deus e, por conseguinte, Deus como Ele, acabavam logicamente pelo fatalismo que destrói a responsabilidade da consciência, negando sua Liberdade, e autoriza todas as desordens. Daí um sensualismo desenfreado, pior que o de Maomé, professado no Alcorão, e que os seus fiéis fizeram entrar em seus costumes. Atacando o matrimônio, que chamavam coito impudico, tomavam ares de apóstolos da castidade; ao passo que sobre os destroços da instituição conjugal estabeleciam uma vergonhosa libertinagem, nos mistérios de suas reuniões privadas. 

Os Albigenses, porém, eram mais do que uma escola, constituíram uma sociedade que, ficando meio subterrânea para ocultar sua feiúra, tinha aparecido para o mundo exterior e tomara lugar ao sol da Europa cristã, a despeito da Igreja e das leis do Estado. Não contentes de vulgarizar seus dogmas, eles os praticavam, atacando a ferro e fogo populações pacíficas, que entendiam governar o que era seu e manter a posse de sua fé e dos direitos políticos e civis que dela decorriam nessa época. 

A idade média, que não poupava o erro puro, não devia perdoar ao erro armado e fraticida. Por conseguinte, os papas e os reis uniram-se contra os Albigenses, como se haviam unido contra os Sarracenos. Alexandre III excomungou-os no terceiro Concílio de Latrão, no ano de 1179. Inocêncio III organizou contra eles a primeira cruzada. 

Agora, qual foi a parte dos Frades Pregadores e dos Frades Menores nestas duas expedições, cujo caráter era uma vez político-religioso? Durante a primeira expedição, a parte principal pertence incontestevelmente aos Frades Pregadores. Eles nasceram no campo de batalha, e expressamente para marchar contra os novos maniqueus com o gládio da palavra. Enquanto S. Francisco se recolhia com seus filhos sob cabanas de folhas, armadas no fundo do vale de Assis, S. Domingos tirava de seu coração uma nova mílicia que ia acampar altiva junto aos muros de Tolosa. 

Estava, pois, o nosso herói tão bem armado de texto decisivos tomados à Santa Escritura, suas provas eram tão sólidas e evidentes, que os míseros adeptos do erro não ousavam aparecer em sua presença nem abrir a boca para lhe responder. Podiam ser-lhe aplicadas, em toda a verdade, as palavras de Jesus Cristo a seus discípulos: Dar-vos-ei lábios eloquentes e uma sabedoria, a que os vossos inimigos não poderão resistir e que eles se guardarão de contradizer. Era mestre na arte de descobrir as fraudes e os artifícios dos hereges; sabia frustar os seus projetos; desmacarava suas doutrinas abomináveis e imprimia-hes o estigma de sua palavra. Como ele mesmo confessava-o de público, não era fácil achar parte alguma quem perseguisse os hereges com tanto ardor e constância.

Vieram por isso todos a chamá-lo o incansável Martelo dos hereges. Os trabalhos deste homem apostólico não ficaram sem fruto. A maior parte dos hereges e os que os favoreciam, voltavam para a verdade, e submetiam-se à autoridade da Santa Madre Igreja. 

Em Montpellier como em Bolonha, Antônio soube conciliar os deveres do mestre com os trabalhos do apóstolo. Pregava frequentemente, fazendo-se tudo para todos segundo o conselho de S. Paulo, a fim de ganhar a todos para Jesus. Sábio com os Maniques, simples com o pobre povo, correspondia a todas as necessidades da situação. Nesse tempo, ocorreu um acontecimento que faz sua santidade resplandecer aos olhos até dos mais prevenidos. Estando ele no púlpito, num dia de grande festa, em presença de todo o clero da cidade, e no meio de enorme concurso de povo, ao começar em seu convento um ofício, para o qual, por descuido, não buscara quem o subtituísse. Era regra que nas principais solenidades dois Frades, dos mais considerados na comunidade, cantassem no coro durante a missa conventual. Naquele dia o servo Deus era um dos designados para essa tarefa. A lembrança causou-lhe viva contrariedade. Viram-no então inclinar-se no púlpito, como que cedendo ao sono, a cabeça envolta no capuz. Mas oh prodígio! No mesmo instante, o homem de Deus apareceu na igreja dos Frades Menores, onde cantou a antífona, enquanto o imenso auditório da catedral o contemplava imóvel e silencioso na tribuna. Este espetáculo durou uma boa hora. Porém o milagre foi logo descoberto. 

Em Tolosa, Antônio operou o famoso milagre, conhecido sob o nome de milagre da mula. Não seja esquecido que entre os erros professados pelos Albigenses estava a negação da presença real de Jesus Cristo no Sacramento do altar. Ora, um dia Antônio sustentou sobre este artigo da fé católica uma longa discussão com certo herege obstinado e influente na cidade. Apertado pela razões sólidas e luminosas do apóstolo, o herege parecia abalado, e propenso a render tributo à verdade; mas parou a meio em tão bom caminho. Como os judeus, esses eternos modelos da cegueira intelectual, pediu sinais prodigiosos: "Prova-me", disse, "por um milagre público, que Jesus Cristo está realmente presente na Eucaristia, como vos esforçastes por estabelecer com os vossos silogismos. Eu juro que renunciarei logo as minhas doutrinas, para me submeter humildemente às que pregais". O desafio era solene: outro qualquer teria hesitado em aceitá-lo. Antônio, sempre inspirado pelo Espírito Santo, respondeu tranquilamente que o aceitava. "Eu possuo uma mula; por três dias deixá-la-ei presa na estrebaria, sem lhe dar nenhum alimento. Decorrido esse tempo, levá-la-ei para a praça diante de todo o povo reunido, e lhe oferecerei de comer. Por vosso lado, vós trareis a hóstia consagrada e apresentá-la-eis à minha mula. Se, a despeito da fome de que estará devorada, ela se desviar do feno e da aveia que eu lhe oferecerei, para ir se prostar ante o vosso Sacramento, eu ficarei convencido, e declarar-me-ei católico". Antônio deu seu consenso à proposta e retirou-se. Foi preparar-se pela oração para vingar a Jesus Cristo dos ultrajes que lhe inflingia a impiedade maniqueia. Reconhecendo-se indigno de ser o instrumento da graça que esperava, pedia a Deus que arrancasse da escravidão do erro tantas almas simples e retas que a torrente da opinião triunfante arrastava para longe de sua Igreja. Chegado o dia da prova imposta, o herege caminhou para a praça, acompanhado de imensa multidão de adeptos, que supunham ir gozar a humilhação do apóstolo franciscano: conduzia a mula pela brida, e levava consigo o alimento que sabia ser o que ela mais gostava. Entretanto, Antônio celebrava a missa numa capela vizinha, com um fervor maior que de ordinário. Quando acabou, recomendou-se aos anjos do santuário; e calmo, não obstante a emoção que o agitava no íntimo, dirigiu-se para o local em que o poder do céu ia manifestar-se. Tinha nas mãos o ostensório de ouro, no meio do qual repousava o Cordeiro que apaga os pecados do mundo. Sua cabeça inclinada, os olhos velados pela modéstia, a fronte resplandecente de uma luz sobrenatural, o andar que lhe traía a santidade: tudo isso era já um espetáculo imponente. Caminhavam atrás dele numerosos fiéis, que recitavam hinos, e estavam impacientes por saber o que sucederia. Chegando à presença de seus adversários, Antônio parou; recolheu-se um instante; em seguida, impôs silêncio à multidão, e voltando-se para a mula, assim lhe falou: "Em nome de teu Criador; que eu trago realmente nas mãos, apesar da minha indignidade; eu te digo, ó animal privado de razão, e te ordeno que venhas imediatamente com humildade prestar-lhe a reverência que lhe deves, a fim de que diante deste sinal os pervertidos hereges reconheçam que toda criatura se deve submeter a seu Criador, que o sacerdócio toca todos os dias no altar". No mesmo instante o dono da mula deu-lhe de comer. Mas - oh prodígio! - o animal que há três dias era guardado à vista e mantido em jejum rigoroso, afastou-se do alimento que se lhe apresentava; e dócil à voz do santo, prostou-se no solo com os dois joelhos e ficou imóvel nessa posição. O povo, que apenas respirava, não pôde conter o seu entusiasmo: aclamações e gritos de alegria romperam de todos os peitos. Os hereges eram derrotados no próprio terreno em que se haviam colocado. Eles sumiram-se logo caladinhos, indo sepultar longe no silêncio a sua derrota e o seu partidarismo obstinado.

Entretanto o servo de Deus não havia perdido o seu tempo. O herege que provocava o milagre se lança aos pés do santo, e adora em alta voz o augusto Mistério, que momentos antes chamava supertição. 

Não se limitou a isto a vitória. O convertido, por sua vez feito apóstolo, reconduziu à verdade toda sua família. Fez construir à própria custa uma igreja que dedicou a S. Pedro, sem dúvida para honrar nele a prerrogativa da fé ortodoxa. Seus descendentes foram além no seu reconhecimento; e, para perpetuarem a lembrança do milagre, edificaram uma capela no próprio lugar em que se havia operado, com uma inscrição em versos destinada a rememorá-lo para sempre. 




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Pe. Antônio At. - História de Santo Antônio de Pádua, Ed. Minha Biblioteca Católica.





terça-feira, 3 de junho de 2025

Importância da salvação




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Deus abençoe por Maria!


Santo Afonso Mª de Ligório

 Rogamus autem vos, frates... ut vestrum negotium agatis.

Mas vos rogamos, irmãos, a avançar cada vez mais (1Ts 4,10).


PONTO I 

O negócio da eterna salvação é, sem dúvida, o mais importante, e, contudo, é aquele de que os cristãos mais se esquecem. Não há diligência que não se efetue, nem tempo que não se aproveite para obter algum cargo, ganhar uma demanda, ou contratar tal casamento...

Quantos conselhos, quantas precauções se tomam! Não se come, não se dorme!... E para alcançar a salvação eterna? Que se faz? Que procedimento se segue?... Nada se costuma fazer; ao contrário, tudo o que se faz é para perdê-la, e a maior parte dos cristãos vive como se a morte, o juízo, o inferno, a glória e a eternidade não fossem verdades da fé, mas apenas fábulas inventadas pelos poetas. Quanta aflição quando se perde um processo ou uma colheita e quanto cuidado para reparar o prejuízo!... Quando se extravia um cavalo ou um cão, quantas diligências para encontrá-los. Muitos perdem a graça de Deus, e entretanto dormem, riem e gracejam!... Coisa estranha, por certo! Não há quem não core ao passar por negligente nos negócios da salvação, que mais do que tudo importa. Confessam que os Santos são verdadeiros sábios porque só trabalham para salvar-se, enquanto eles atendem a todas as coisas do mundo, sem se importar com sua alma. Mas vós - disse São Paulo - vós, meus irmãos, pensai unicamente no magno assunto de vossa salvação, pois constitui o negócio da mais alta importância. 

Persuadamo-nos, pois, de que a felicidade eterna é para nós o negócio mais importante, o negócio único, o negócio irreparável se não o pudermos realizar. 

É, sem contestação, o negócio mais importante, porque é das mais graves consequências, vem vista de se tratar da alma, e, perdendo-se esta, tudo está perdido. Devemos estimar a alma - disse São João Crisóstomo - como o mais precioso dos bens. Para compreender esta verdade, basta considerar que Deus sacrificou seu próprio Filho à morte para salvar nossas almas (Jo 3,16). O Verbo Eterno não vacilou em resgatá-las com seu próprio sangue (1Cor 6,20). De maneira que - disse um Santo Padre, - parece que o homem vale tanto como Deus. 

Daí esta palavra de Nosso Senhor Jesus Cristo: "Que dará o homem em troco de sua alma"? (Mt 16,26). Se tem tamanho valor a alma, qual o bem do mundo que poderá dar em troca o homem que a vem a perder? Razão tinha São Filipe Néri em chamar de louco ao homem que não trabalhava na salvação de sua alma. Se houvesse na terra dos homens mortais e homens imortais e aqueles vissem estes se aplicarem afanosamente às coisas do mundo, procurando honras, riquezas e prazeres terrenos, dir-lhes-iam sem dúvida: "Quanto sois insensatos! podeis adquirir bens eternos e só pensais nas coisas miseráveis e passageiras, condenando-vos a penas eternas na outra vida!... Deixai-os, pois; nesses bens só devem pensar os desventurados que, como nós, sabem que tudo se acaba com a morte!..." Isto, porém, não é assim: todos somos imortais... Como se haverá, portanto, a aquele que, por causa dos miseráveis prazeres do mundo, perde a sua alma?... Como se explica - disse Salviano - que os cristãos creiam no juízo, no inferno, na eternidade, e vivam sem receio de nenhuma dessas coisas? 


AFETOS E SÚPLICAS

Ah! Meu Deus! De que me serviriam tantos anos de vida que me concedestes para adquirir a salvação eterna?... Vós, Redentor meu, resgatastes minha alma com o vosso sangue e me entregastes para que a salvasse; entretanto eu apenas me tenho aplicado em perdê-la, ofendendo-vos, que tanto me haveis amado! De todo o coração, agradeço-vos que ainda me concedeis tempo para reparar o mal que fiz. 

Perdi a alma e vossa santa graça; arrependo-me, Senhor, e detesto sinceramente os meus pecados. Perdoai-me, pois que estou firmemente resolvido a perder todos os bens, inclusive a vida, mas não quero perder a vossa amizade. Amo-vos sobre todas as coisas e tenho a firme vontade de amar-vos sempre, ó Sumo Bem, digno de infinito amor! Ajudai-me, meu Jesus, a fim de que esta minha resolução não seja semelhante a meus propósitos anteriores, que foram outras tantas infidelidades.

Fazei que morra, antes que volte a ofender-vos e deixar de vos amar...

Ó Maria, minha esperança, salvai-me, obtendo para mim o dom da perseverança!


PONTO II

A salvação eterna não é só o mais importante, senão o único negócio que nesta vida nos impende (Lc 10,42). São Bernardo deplora a cegueira dos cristãos que, qualificando de brinquedos infantis certos passatempos da infância, chamam negócios sérios suas ocupações mundanas. Maiores loucuras são as néscias puerilidades dos homens. 

 "Que aproveita ao homem - disse o Senhor - ganhar o mundo inteiro e perder sua alma? (Mt 16,26). Se tu te salvas, meu irmão, nada importa que no mundo hajas sido pobre,  perseguido e desprezado. Salvando-te, acabar-se-ão os males e serás feliz por toda a eternidade. Mas, se te enganares e te perderes, de que te servirá no inferno haveres desfrutado de todos os prazeres do mundo, teres sido rico e cortejado? Perdida a alma, tudo está perdido: honras, divertimentos e riquezas. 

Que responderás a Jesus Cristo no dia do juízo? Se um rei enviasse um embaixador a uma grande cidade, a fim de tratar de um negócio importante, e esse ministro, em vez de ali dedicar-se à missa que lhe fora confiada, só se ocupasse de banquetes, festas e espetáculos, de modo que por sua negligência fracassasse a negociação, que contas poderia dar ao rei à sua volta? Do mesmo modo, ó meu Deus, que conta poderá dar ao Senhor no dia do juízo, aquele que, colocado neste mundo, não para divertir-se, nem enriquecer, nem adquirir honras, senão para salvar sua alma, infelizmente a tudo atendeu, menos à sua alma? Os mundanos não pensam no presente e nunca no futuro. São Filipe Néri, falando certa vez em Roma com um jovem talentoso chamado Francisco Nazzera, assim se expressou: "Tu, meu filho, terás carreira brilhante: serás bom advogado, depois prelado, a seguir cardeal, quem sabe? Talvez Papa... mas depois? e depois? Ide, disse-lhe ao fim, pensai nestas últimas palavras." Foi Francisco para casa e, meditando no sentido daquelas palavras "e depois? e depois?" abandonou os negócios terrenos, deixou o mundo para ingressar na mesma congregação a que pertencia São Filipe Néri, e aí ocupar-se somente em servir a Deus. 

Este é o único negócio, porque só temos uma alma. Certo príncipe solicitou a Bento XII uma graça que não podia ser concedida sem pecado. 

Respondeu o Papa ao embaixador: "Dizei a vosso soberano que, se eu tivesse duas almas, poderia sacrificar uma por ele e reservar a outra para mim, mas como só tenho uma, não quero perdê-la". São Francisco Xavier dizia que no mundo há um só bem e um só mal. O único bem, salvar-se; condenar-se, o único mal. A mesma verdade expunha Santa Teresa e suas religiosas: "Minhas irmãs, uma alma e uma eternidade"; o que quer dizer: há uma alma, e perdida esta, tudo está perdido; há uma eternidade, e a alma, uma vez perdida, para sempre o será. Por isso, David suplicava a Deus, e dizia: Senhor, uma só coisa vos peço: salvai-me a alma, e nada mais quero (Sl 26,4). 

Com receio e com temor trabalhai na vossa salvação (Fl 2,12). 

Quem não receia nem teme perder-se, não se salvará, porque para se salvar é preciso trabalhar e empregar violência (Mt 11,12). Para alcançar a salvação é necessário que, na hora da morte, apareça a nossa vida semelhante à de Nosso Senhor Jesus Cristo (Rm 8,29). Para este fim devemos esforçar-nos em evitar as ocasiões perigosas e empregar os meios necessários para conseguir a salvação. "O reino dos céus não se dará aos indolentes - diz São Bernardo, - senão aos que trabalharam no serviço do Senhor". 

Todos desejariam salvar-se, mas sem o menor incômodo. "O demônio - diz Santo Agostinho - trabalha sem repouso para perder-te, e tu, tratando-se de tua felicidade ou da tua desgraça eterna, tanto te descuidas?". 


AFETOS E SÚPLICAS

Ó meu Deus! Quanto vos agradeço terdes permitido que me ache agora a vossos pés e não no inferno, que tantas vezes mereci! De que me serviria a vida que me reservais, se continuasse a viver privado de vossa graça?... Ah, nunca mais será assim! Voltei-vos a costas, e vos perdi, meu Sumo Bem!... Mas arrependo-me de todo o coração... Oxalá tivesse eu morrido antes de mil vezes! Perdi-vos, mas vosso Profeta me assegura que sois todo bondade e que vos deixais achar pelas almas que vos procuram. Se no passado me afastei de vós, ó Rei de minh'alma, agora vos procuro... A vós somente procuro, Senhor. Amar-vos com todas as minhas forças. Aceitai-me e não vos indigneis de que vos ame este coração que outrora vos desprezou. Ensinai-me o que tenho a fazer para vos agradar (Sl 143,10), pois desejo pô-lo em prática. Ó meu Jesus, salvai esta alma que redimistes com vossa vida e vosso sangue. 

Dai-me a graça de vos amar sempre nesta vida e na outra. Assim o espero pelos vossos infinitos merecimentos. 

E também, Maria Santíssima, por vossa poderosa intercessão.


PONTO III

Negócio importante, negócio único, negócio irreparável. Não há falta que se possa comparar, diz Santo Eusébio, ao desprezo da salvação eterna. Todos os demais erros podem ter remédio. Perdidos os bens, é possível readquirir outros por meio de novos trabalhos. Perdido um emprego, pode ser recuperado. Ainda no caso de perder a vida, se salvar a alma, tudo está preparado. Mas para quem se condena, não há possibilidade de remédio. Morre-se uma vez, e perdida uma vez a alma, está perdida para sempre. Só resta o pranto eterno com os outros míseros insensatos do inferno, cuja pena e maior tormento consiste em pensar que para eles já não há mais tempo de remediar sua desdita (Jr 8,20). Perguntai a esses sábios do mundo, mergulhados agora no fogo infernal, perguntai-lhes o que sentem e pensam; se estão contentes por terem feito fortuna na terra, mesmo que se condenaram à eterna prisão. 

Escutai como gemem dizendo: Erramos, pois... (Sb 5,6). Mas de que lhes serve agora reconhecer o seu erro, quando já a condenação é irremediável para sempre? Qual não seria o pesar daquele que, tendo podido prevenir e evitar com pouco esforço a ruína de sua casa, a encontrasse um dia desabada, e só então considerasse seu próprio descuido, quando não houvesse já remédio possível? Esta é a maior aflição dos réprobos: pensar que perderam sua alma e se condenaram por sua culpa (Os 13,9). Disse Santa Teresa que, se alguém perde, por sua culpa, um vestido, um anel ou outro objeto, perde a tranquilidade e, às vezes, não come nem dorme. Qual será, pois, ó meu Deus, a angústia do condenado quando, ao entrar no inferno, se vir sepultado naquele cárcere de tormentos, e, atendendo à sua desgraça, considerar que durante toda a eternidade não há de chegar remédio algum! Sem dúvida exclamará: "Perdi a alma e o paraíso, perdi a Deus; tudo perdi para sempre, e por quê? por minha culpa! E se alguém objetar: Mesmo que cometa esta pecado, porque hei de me condenar?... Acaso, não poderei salvar-me? Responder-lhe-ei: Também pode ser que te condenes". Ainda direi que até há mais probabilidade em favor de tua condenação, porque a Santa Escritura ameaça com este tremendo castigo aos pecadores obstinados, como tu o és neste instante. "Ai dos filhos que desertam!" (Is 30,1) - diz o Senhor. - "Ai daqueles que se afastam de mim" (Os 7,13). E não pões ao menos, com esse pecado cometido, a tua salvação eterna em grande perigo e grande incerteza? E qual é este negócio que assim se pode arriscar? Não se trata de uma casa, de uma cidade, de um emprego; trata-se, - diz São João Crisóstomo, - de padecer uma eternidade de tormentos e de perder um paraíso de delícias. E este negócio, que tanto te deve importar, queres arriscá-lo por um talvez? "Quem sabe - dizes, - quem sabe se me condenarei? Esquero que Deus mais tarde me há de perdoar". 

E entretanto?... Entretanto, por ti mesmo te condenas ao inferno. 

Por acaso te atirarias a um poço, dizendo: talvez escape da morte? - Não, de certo. Como podes expor tua eterna salvação numa tão frágil esperança, num quem sabe? Oh! quantos, por causa dessa maldita falsa esperança, se perderam!... Não sabes que a esperança dos obstinados no pecado não é esperança, mas presunção e ilusão que não promovem a misericórdia divina, mas provocam sua indignação? Se dizes que presentemente não estás em estado de resistir às tentações, à paixão dominante, como resistirás mais tarde, quando, em vez de aumentar, te faltará a força pelo hábito de pecar? Por uma parte, a alma estará mais cega e mais endurecida na malícia, e por outra faltar-lhe-á o auxílio divino... Acaso, esperas que Deus aumente para ti suas luzes e suas graças depois que tu hajas aumentado ilimitadamente tuas faltas e pecados? 


AFETOS E SÚPLICAS 

Ah, meu Jesus! Atendendo à morte que por mim padecestes, aumentai minha esperança. Temo que, no fim de minha vida, o demônio me faça cair em desespero, em vista das inúmeras infidelidades que para convosco hei cometido. Quantas vezes prometi não tornar a ofender-vos, movido pelas luzes que me haveis dado, e voltei a afastar-me de vós na esperança do perdão. Foi por não me haverdes castigado, que tanto vos ofendi! Porque usastes de misericórdia para comigo, que tantos ultrajes vos fiz!? Dai-me, meu Redentor, antes que deixe esta vida, profundo e verdadeiro arrependimento de meus pecados. Pesa-me, ó Suma Bondade, de vos ter ofendido, e prometo firmemente antes morrer mil vezes que separar-me de vós... Permiti, entretanto, que ouça as palavras que dissestes a Santa Madalena: "Teus pecados estão perdoados" (Lc 7,48), e inspirai-me grande dor de minhas culpas antes que chegue o transe da morte. Doutro modo, receio que essa hora vá trazer-me inquietação e desgraça. Naquele momento extremo, vossa presença não me cause receio, meu Jesus crucificado! Se morresse agora, antes de chorar minhas culpas, antes de vos amar, então vossas chagas e vosso sangue me causariam mais susto que esperança. Não vos peço, pois, consolo e bens terrestres para o resto da vida. Peço-vos somente amor e dor. Ouvi-me, amantíssimo Salvador, por aquele amor que vos fez sacrificar por mim a vida no Calvário... 

Maria, minha Mãe, alcançai-me estas graças unidas à da perseverança  até à morte. 

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Santo Afonso Mª de Ligório - Preparação para a morte





domingo, 25 de maio de 2025

Valor do tempo




  Ajude este apostolado colaborando com qualquer valor. 

Deus abençoe por Maria!



Santo Afonso Maria de Ligório 


Fili, conserva tempus. 
Filho, aproveita o tempo (Sr 4,23).

PONTO I

Diligencia, meu filho, - diz o Espírito Santo, - em empregar bem o tempo, porque é a coisa mais preciosa, riquíssimo dom que Deus concede ao homem mortal. Até os próprios gentios tinham conhecimento de seu valor. Sêneca dizia que nada pode equivaler ao valor do tempo. Com maior estimação ainda o apreciaram os Santos. Afirma São Bernardino de Sena que um só momento vale tanto como Deus, porque nesse instante, com um ato de contrição ou de amor perfeito, pode o homem adquirir a graça divina e a glória eterna. 
O tempo é um tesouro que só se acha nesta vida, mas não na outra, nem no céu, nem no inferno. É este o grito dos condenados: "Oh! se tivéssemos uma hora!"... Por todo o preço comprariam uma hora a fim de reparar sua ruína; porém, esta hora jamais lhes será dada. No céu não há pranto; mas se os bem-aventurados pudessem sofrer, chorariam o tempo perdido na sua vida mortal, o qual lhes poderia ter servido para alcançar grau mais elevado na glória; porém, já se passou a época de merecer. Uma religiosa beneditina, depois da morte, apareceu radiante de glória a uma pessoa e lhe revelou que gozava de plena felicidade, mas, se algo pudesse desejar, seria unicamente voltar ao mundo para sofrer mais e assim alcançar maior mérito. Acrescentou que de boa vontade sofreria até o dia do juízo a dolorosa enfermidade que a levou à morte, contanto que conseguisse a glória que corresponde ao mérito de uma só Ave-Maria. 
E tu, meu irmão, em que empregas o tempo?... Por que sempre adias para amanhã o que podes fazer hoje? Reflete que o tempo passado desapareceu e já não te pertence; que o futuro não depende de ti. 
Só dispões do tempo presente para agir... Ó infeliz! - adverte São Bernardo, - por que ousas contar com o vindouro, como se Deus tivesse posto o tempo em teu poder?". E Santo Agostinho disse: Como te podes prometer o dia de amanhã, se não dispões de uma hora de vida? "Daí conclui Santa Teresa: "Se não estiveres preparado hoje para morrer, teme morrer mal..."


AFETOS E SÚPLICAS

Dou-vos graças, meu Deus, pelo tempo que me concedes para reparar as desordens de minha vida passada. Se chegasse a morrer neste momento, a maior de minhas penas seria pensar no tempo que perdi!... Ah! Senhor meu, deste-me o tempo para vos amar e empreguei-o a ofender-vos. Merecia ser lançado no inferno desde o primeiro momento em que me apartei de vós; mas chamastes-me à penitência e me perdoastes. Prometi jamais tornar a ofender-vos, entretanto quantas vezes voltei a injuriar-vos e vós ainda me perdoastes!... Bendita seja eternamente a vossa misericórdia! Se não fosse infinita, como teria podido aturar-me tanto tempo? Quem poderia ter comigo a paciência  que vós tivestes?... Quanto me pesa ter ofendido um Deus tão bom!...

Meu querido Salvador, mesmo que fosse somente pela paciência que tínheis comigo, deveria estar inflamado de amor por vós. Não permitais que viva por mais tempo ingrato ao amor que me tendes demonstrado.

Desprendei-me de tudo e atrai-me ao vosso amor... Não, meu Deus, não quero continuar a perder o tempo que me dais para remediar as faltas cometidas, mas empregá-lo todo no vosso serviço e no vosso amor. Amo-vos, bondade infinita, e espero amar-vos eternamente. 

Mil graças vos dou, Virgem Maria, por terdes sido minha advogada na consecução deste tempo da vida. Auxiliai-me agora e fazei que o empregue sem reserva em amar o vosso Filho, meu Redentor, e a vós também, minha Rainha e minha Mãe!


PONTO II

Nada há mais precioso que o tempo e não há coisa menos estimada nem mais desprezada pelos mundanos. Isto deplora São Bernardo, dizendo: "Passam rapidamente os dias da salvação, e ninguém reflete que esses dias desaparecem e jamais voltam". Vede aquele jogador que perde dias e noites na tavolagem. Perguntai-lhe o que fez e responderá: "Passar o tempo". Vede o ocioso que se entretém horas inteiras na rua a ver quem passa, ou a falar em coisas obscenas ou inúteis. Se lhe perguntam o que está fazendo, dirá que não faz mais do que passar o tempo. Pobres cegos, que assim vão perdendo tantos dias, dias que nunca mais voltam! Ó tempo desprezado! tu serás a coisa que os mundanos mais desejarão no transe da morte... Queremos então dispor de mais um ano, mais um mês, mais um dia; mas não o terão, e ouvirão dizer que já não haverá mais tempo (Ap 10,6). O que não daria então cada um deles para ter mais uma semana, um dia de vida, a fim de poder melhor ajustar as contas da alma!... Ainda que fosse para alcançar só uma hora - disse São Lourenço Justiniano - dariam todos os seus bens. Mas não obterão essa hora de trégua... Pronto, dirá o sacerdote que o estiver assistindo, apressa-te a sair deste mundo; já não há mais tempo para ti. 

Por isso, exorta o profeta a que nos lembremos de Deus e procuremos sua graça antes que a luz se nos extinga (Ecl 12,1-2). Que apreensão não sentirá um viajante ao notar que se transviou no caminho, quando, por ser já noite, não lhe é possível reparar o engano!... Tal será a mágoa na morte do que tiver vivido muitos anos sem empregá-los no serviço de Deus. "Virá a noite em que ninguém poderá fazer mais nada". (Jo 9,4). Então o momento da morte será para ele o tempo da noite, em que nada mais poderá fazer. "Clamou contra mim o tempo" (Lm 1,15). A consciência recordar-lhe-á todo o tempo que teve e que empregou em prejuízo de sua alma; todas as graças que recebeu de Deus para se santificar e de que não quis aproveitar; e ver-se-á depois privado de todos os meios de fazer o bem. Por isso exclamará gemendo: Como fui insensato!... Ó tempo perdido, em que podia ter-me santificado!... Mas não o fiz e agora já não é tempo de o fazer... De que servem tais suspiros e lamentações, quando a vida está prestes a terminar e a lâmpada se vai extinguindo, vendo-se o moribundo próximo do solene instante de que depende a eternidade? 


AFETOS E SÚPLICAS

Ah, meu Jesus! santificastes toda a vida para salvar minha alma; nem um instante deixastes de vos oferecer por mim ao Eterno Pai, a fim de me alcançar perdão e salvação... e eu, ao cabo de tantos anos de vida neste mundo, quanto tempo empreguei em vosso serviço? As recordações de meus atos fazem-me remorsos de consciência. O mal foi grande. O bem pouquíssimo e cheio de imperfeições, de tibieza, de amor próprio e de distrações. Ah, meu Redentor, tudo isto tem sido porque olvidei o que por mim fizestes! Esqueci-vos, Senhor, mas vós não vos esquecestes de mim; viestes a procurar-me e repetidas vezes me oferecestes o vosso amor enquanto eu fugia de vós. Aqui estou, ó bom Jesus; não quero resistir por mais tempo, nem pensar que me abandonareis. Pesa-me, meu soberano Bem, de ter-me afastado de vós pelo pecado. Amo-vos, bondade infinita, digna de infinito amor. Não permitais que perca o tempo que vossa misericórdia me concede. 

Lembrai-vos, amado Salvador meu, do amor que me tendes e das dores que por mim padecestes. Fazei que esqueça tudo na vida que me resta, exceto pensar só em vos agradar. Amo-vos, meu Jesus, meu amor, meu tudo. Prometo fazer frequentíssimos atos de Amor. Concedei-me a santa perseverança, como espero, confiado nos merecimentos de vosso sangue precioso...

E em vossa intercessão confio ó Maria, minha Mãe querida!


PONTO III

Devemos caminhar pela via do Senhor enquanto temos vida e luz, porque esta logo desaparece na morte (Lc 12,40). Então já não é tempo para preparar-se, mas de estar pronto (Jo 12,35). Quando chega a morte, não se pode fazer nada: o que está feito esta feito... Ó Deus! Se alguém soubesse que em breve se decidiria a causa de sua vida ou morte, ou de toda a sua fortuna, com que ardor não procuraria um bom advogado, diligenciaria para que os juízes conhecessem nitidamente as razões que lhe assistem, e trataria de empregar os meios para obter sentença favorável!... O que fazemos nós? Sabemos com certeza que muito brevemente, no momento em que menos o pensamos, se há de julgar a causa do maior negócio que temos, isto é, do negócio de nossa salvação eterna... e ainda perdemos tempo? Dirá talvez alguém: "Sou ainda moço; mais tarde me converterei a Deus". Sabe - respondo - que o Senhor amaldiçoou aquela figueira que achou sem frutos, posto que não fosse estação própria, como observa o Evangelho (Mc 11,13). Com este fato quis Jesus Cristo dar-nos a entender que o homem, em todo tempo, sem excetuar a mocidade, deve produzir frutos de boas obras, senão será amaldiçoado e nunca mais dará frutos no futuro. Nunca jamais com alguém fruto de ti (Mc 11,14). Assim falou o Redentor àquela árvore, e do mesmo modo amaldiçoa a quem ele chama e lhe resiste... Circunstância digna de admiração! Ao demônio parece breve a duração de nossa vida, e é por isso que não deixa escapar ocasião de nos tentar. "Desceu a vós o demônio com grande ira, sabendo que lhe resta pouco tempo" (Ap 12,12). De sorte que o inimigo não perde nem um instante para desgraçar-nos e nós não aproveitamos, o tempo para nos salvar! Outro dia: Qual é o mal que faço?... Ó meu Deus! E já não é um mal perder o tempo em jogos e conversações inúteis, que de nada servem à nossa alma? Acaso nos dá Deus esse tempo para que assim o percamos? Não, diz o Espírito Santo: Particula boni doni non te praetereat (Ecl 14,14). Aqueles operários de que fala São Mateus não faziam nenhum mal; somente perdiam o tempo, e é por isso que o dono da vinha os repreendeu: "Que estais aqui todo o dia ociosos?" (Mt 20). No dia do juízo, Jesus Cristo nos pedirá conta de toda palavra ociosa. Todo o tempo que não é empregado para Deus, é tempo perdido. E o Senhor nos diz: "Qualquer coisa que possa fazer tua mão, fá-la com instância; porque nem obra, nem razão de sabedoria, nem ciência haverá no sepulcro, para onde caminhas célere" (Ecl 9,10). A venerável irmã Joana da Santíssima Trindade, filha de Santa Teresa, dizia que na vida dos Santos não há dia de amanhã; só o que há na vida dos pecadores, que dizem sempre "mais tarde, mais tarde" e é assim que chegam à morte. "É agora o tempo favorável" (2Cor 6,2). "Se hoje ouvirdes a sua voz, não queirais endurecer vossos corações" (Sl 94,8). Hoje Deus te chama a fazer o bem; faze-o hoje mesmo, porque amanhã talvez já não terás tempo, ou Deus não te chamará. 

E, se por desgraça na vida passada empregaste o tempo em ofender a Deus, procura agora expiar essa falta no resto de tua vida mortal, como resolveu fazer o rei Ezequias: "Repassarei diante de ti todos os meus anos com a amargura de minha alma" (Is 38,15). Deus te prolonga a vida para que resgates o tempo perdido: "Recobrando o tempo, pois que os dias são maus" (Ef 5,16); ou ainda, segundo comenta Santo Anselmo: "Recuperarás o tempo se fizeres o que descuidastes de fazer". 

São Jerônimo diz de São Paulo que, não obstante ser o último dos apóstolos, tornou-se o primeiro em méritos pelos seus trabalhos depois da vocação. Consideremos ao menos que em cada instante podemos ganhar maior cópia de bens eternos. Se nos cedessem a propriedade do terreno que pudéssemos contar num dia, ou o dinheiro que pudéssemos contar num dia, que esforços não faríamos! Pois, se podemos adquirir em um instante tesouros eternos, por que havemos de malgastar o tempo? O que podes fazer hoje não diga que o farás amanhã, porque o dia de hoje se perderá e não mais voltará. Quando São Francisco de Borja ouvia falar das coisas mundanas, elevava o coração a Deus com tão santos afetos que não sabia responder quando lhe perguntavam qual era o seu sentir acerca do que haviam dito. Repreenderam-no por isso, e ele contestou que antes preferia parecer homem rude do que perder futilmente o tempo. 


AFETOS E SÚPLICAS

Não, meu Deus, não quero perder o tempo que me haveis concedido por vossa misericórdia... Mereci estar já no inferno, gemendo sem esperança. Dou-vos, pois, fervorosas graças por me terdes conservado a vida. Desejo, nos dias que me restam, viver somente para vós. Se estivesse no inferno, choraria desesperado e sem fruto. Agora chorarei as ofensas que cometi contra vós e, chorando-as, estou certo de que mas perdoareis, segundo assegura o Profeta (Is 30,19). No inferno me seria impossível amar-vos; agora vos amo e espero amar-vos sempre. 

No inferno jamais poderia pedir a vossa graça; agora ouço que dizeis: "Pedi e recebereis" (Jo 16,24). Posto que ainda é tempo para vos pedir graças, duas são as que vos peço: Concedei-me, ó Deus, a perseverança no vosso santo serviço e dai-me o vosso amor; depois fazei de mim o que quiserdes. Fazei que, em todos os instantes que me restam da vida, eu me recomende a vós, dizendo: "Ajudai-me, Senhor... Senhor, tende piedade de mim; fazei que não vos ofenda; fazei que vos ame". 

Virgem Santíssima, minha mãe, alcançai-me a graça de me recomendar sempre a Deus e pedir-lhe seu santo amor e a perseverança.

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Santo Afonso Maria de Ligório - Preparação para a morte