quarta-feira, 4 de setembro de 2019
Trecho 2 - Tratado da Conformidade com a Vontade de Deus
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Tem sido sempre este o fim que os santos todos têm levado em vista: a conformidade com a vontade de Deus, conhecendo muito bem que nisto consistia a pureza da alma. O beato Henrique Suso disse: "Deus não quer que nos abundemos em luzes espirituais, mas sim que em tudo nos conformemos com a Sua divina vontade". E Santa Teresa: "Tudo o que se deve procurar no exercício da oração é a conformidade da nossa vontade com a vontade divina, tendo por certo que nisto consiste a maior perfeição. Aquele que for mais superior nesta prática, receberá maiores graças de Deus, e fará os maiores progressos no caminho da perfeição". A Beata Estefânia de Soncino, religiosa da Ordem de São Domingos, sendo arrebatada em espírito e levada ao Céu em uma visão, viu algumas pessoas que conhecia e que tinham morrido colocadas entre os serafins, e lhe foi dito que tinham sido exaltadas a tão alto grau de glória em consequência de sua conformidade com a vontade de Deus enquanto estiveram sobre a Terra: e o beato Suso, que acima mencionamos, falando de si mesmo, exclama: "Eu queria antes ser o mais vil inseto que se arrasta pela terra, pela vontade de Deus, do que ser um serafim pela minha vontade. Nós devemos neste mundo aprender dos santos, que estão no Céu, a maneira de amar a Deus. O amor, puro e perfeito, que os bem-aventurados no Céu têm para com Deus consiste em uma perfeita união da sua vontade à divina vontade, que eles levantassem montes de areia sobre as praias do mar, por toda a eternidade, ou que arrancassem erva nos jardins, eles o fariam com o maior prazer e gosto. E mais ainda: se Deus lhes dissesse que seriam queimados no fogo do inferno, eles desceriam imediatamente ao abismo, para cumprirem a vontade divina. E é o que Jesus Cristo nos ensina a pedir, que se faça a vontade de Deus na terra, como os santos o fazem no Céu (Mt 6,10). Nosso Senhor chama a Davi "um homem segundo o meu coração, porque cumpriu todas as minhas vontades" (At 13,22).
Davi sempre estava pronto a abraçar a divina vontade, como ele mesmo declara. "O meu coração está pronto, ó meu Deus, o meu coração está pronto!" (Sl 56,8). E tudo quanto ele pedia ao Senhor era que lhe ensinasse a cumprir a sua divina vontade: "Ensinai-me a fazer a Vossa Vontade" (Sl 142,10). Um ato de perfeita uniformidade com a vontade divina basta para constituir um santo. Veja-se São Paulo: no tempo em que era o perseguidor da Igreja, foi iluminado e convertido por Jesus Cristo; e depois, como procedeu? Que disse? Tudo quanto fez foi oferecer-se à divina vontade, dizendo: "Senhor, que quereis vós que eu faça?" (At 9,6). E o Senhor lhe declarou que seria um vaso de eleição e o Apóstolo dos gentios (At 9,15). Aquele que entrega a Deus a sua vontade, entrega-lhe tudo. Quem dá seus bens em esmolas, seu corpo às disciplinas, e seu alimento ao jejum dá uma parte do que possui: mas aquele que entrega a Deus a sua vontade, dá tudo, e pode dizer: "Senhor, eu sou pobre, mas eu vos dou tudo quanto possuo, dando-vos a minha vontade, e nada mais tenho que vos dar".
É isto só que Deus espera de nós: "Filho", diz Ele a cada um de nós, "dá-me o teu coração" (Pr 23,26), isto é, a tua vontade; nós, diz Santo Agostinho, não podemos oferecer a Deus coisa mais agradável do que dizer-lhe: "Senhor, tome posse de nós: nós vos entregamos a nossa vontade, fazei-nos saber o que exigis de nós, e nós o cumpriremos". Se, pois, queremos dar um grande prazer a Deus, devemos conformar-nos com a Sua divina vontade; mas não só conformar-nos, porém unirmo-nos aos seus mandados: conformidade que expressa a união da nossa vontade com a vontade de Deus; mas a uniformidade quer dizer mais, quer dizer que a vontade divina e a nossa seja uma só: de maneira que não devemos desejar senão o que Deus deseja e quer. É esta a maior perfeição à qual devemos aspirar: este deve ser o objeto de todas as nossas ações, de todos os nossos desejos, meditações e orações. Para isto devemos pedir o socorro do nosso Anjo da guarda e dos santos, nossos advogados, e, sobretudo, a proteção da Santíssima Mãe de Deus, a qual é a mais perfeita entre todos os santos, e porque foi quem mais perfeitamente abraçou a vontade divina em todas as ocasiões.
Santo Afonso Mª de Ligório - Ed. Biblioteca Católica
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