Quão loucos são aqueles que desejam a saúde, não só para não sofrerem, mas para mais poderem servir a Deus, observando as regras, assistindo em comunidade, indo à igreja, recebendo a Sagrada Comunhão, fazendo penitências, trabalhando, ouvindo confissões e pregando! Mas, pergunto eu, porque desejais vós fazer essas coisas?
Para agradar a Deus? Para que procurais vós agradar-Lhe nessas coisas, quando conheceis que lhe não é agradável a prática de vossas ordinárias devoções, comunhões, penitências, estudos ou sermões; mas sim que suporteis com paciência as dores e enfermidades que Ele foi servido mandar-vos? Uni, pois, vossos padecimentos aos de Jesus Cristo. "Porém, é-me penoso ser inútil e pesado à comunidade". Conformai-vos com a vontade de Deus, e persuadi-vos que vossos superiores estão resignados a ela, vendo que servis de peso à comunidade, é pela vontade de Deus, e não por preguiça vossa. Vossos desejos e mortificações não procedem do amor de Deus, mas sim do amor próprio, que procura pretextos para se desviar da vontade divina. Se desejarmos agradar a Deus, quando nos acharmos doentes e de cama, basta repetir estas palavras: "Senhor, seja feita a vossa vontade", por cujas palavras agradaremos mais a Deus que por todas as devoções e mortificações que nos seja possível oferecer. Não há melhor caminho no serviço de Deus do que aquele que nos conduza a abraçar a Sua vontade com alegria. O venerável Padre Ávila (Epist. 2) escreveu a um sacerdote que estava enfermo: "Amigo, não vos inquieteis com o bem que poderíeis fazer, se estivésseis bom, mas contentai-vos de continuar doente todo o tempo que Deus quiser. Se procurais a vontade de Deus, indiferente vos deve ser o estar mal ou bem de saúde". E certamente assim o podia dizer, porque as nossas obras não glorificam a Deus, mas sim a nossa resignação e conformidade à Sua santíssima vontade.
Daqui diz também São Francisco de Sales, que Deus é mais bem servido por nossos padecimentos do que por nossas fadigas.
Em muitas ocasiões os médicos ou remédios faltam, ou o médico não percebe a moléstia. Em tal caso devemos unir-nos à vontade divina, que tudo isto dispõe para nosso maior bem. Conta-se de um devoto de São Tomás de Cantuária (L. 5. O. 1.) que estando doente fora à sepultura do santo para recuperar a saúde. Melhorou, pois, e voltou ao seu país; porém, pensou, então, consigo mesmo: "Se a minha enfermidade fosse vantajosa para a minha salvação, que uso poderei fazer da saúde?". Neste pensamento, voltou ao sepulcro do santo, e lhe suplicou que rogasse a Deus para que lhe concedesse o que melhor contribuísse para a sua salvação; depois do que, recaiu com a mesma doença, e ficou perfeitamente satisfeito, persuadindo-se que Deus o aflingia para seu maior bem. Súrio relata o mesmo de um cego, que tinha recobrado a vista pela intercessão de São Vedasto, bispo; mas que depois pediu que se a vista não lhe era proveitosa à alma, queria tornar a ser cego, como antes. Portanto, ou estejamos enfermos ou sãos, não devemos pedir nem a saúde nem a moléstia, porém entregarmo-nos inteiramente à divina vontade de Deus, que é quem dispõe de nós como lhe apraz. Mas, se pedir-mos a saúde, seja ao menos pedida com resignação e expressa condição de que a saúde do corpo não seja prejudicial à salvação da alma, de outro modo nossa súplica seria defeituosa, e não seria ouvida, porque Deus só ouve aquelas súplicas que são acompanhadas de resignação.
Santo Afonso Mª de Ligório - Ed. Biblioteca Católica
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