segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Nossa Senhora de Almudena

Espanha - Madri


Quando Madri foi tomada definitivamente aos mouros, Nossa Senhora de Almudena, passou a ser, justamente com Nossa Senhora de Atocha, padroeira do povo madrileno.

O título  -  Nossa Senhora "de Almudena" provém do lugar em que foi encontrada a imagem, que, como tantas outras, havia sido escondida, para não ser profanada.

Todos estão de acordo que a imagem foi escondida na muralha que circundava a vila de Madri, e que aí foi encontrada, mas não concordam no que se refere à época e às circunstâncias em que se deu a sua descoberta. 

Há duas tradições acerca do encontro da imagem: uma diz que foi encontrada durante o assalto do exército de Afonso VI à muralha de Madri, parte da qual desmoronou, aparecendo a imagem; a outra tradição é contada da seguinte maneira: logo que o rei D. Afonso se apoderou de Madri, procedeu-se à purificação da igreja de Santa Maria, que havia sido profanada pelos mouros, e, como não tinha sido encontrada a imagem da Virgem levada para lá por São Tiago, a qual  tinha ocupado o altar-mór do mencionado templo, mandou o Rei que pintasse e fosse colocada em seu lugar outra imagem, que foi chamada - da Flor, por causa de uma flor que o pintor lhe pôs na mão, pintura esta que depois foi colocada no fundo da igreja, quando foi recolocada em seu lugar a antiga imagem. 

Como o Rei sabia da existência  dessa imagem antes da irrupção maometana, fez o voto de procurá-la  com toda a diligência, e, depois de desembaraçar-se dos encargos mais urgentes, e de fazer que se restabelecesse o culto na igreja de Santa Maria, organizou de acordo com a autoridade eclesiástica uma procissão de rogativa, para impetrar do Senhor o encontro da sagrada imagem, ao redor das muralhas da vila. 

Organizado o piedoso cortejo, foi circundando todo o recinto murado, entoando cânticos  e recitando com fervor diversas orações, para obterem da misericórdia divina que lhes mostrasse o lugar onde estava oculta a milagrosa imagem. 
Deste modo chegaram à parte da muralha que dava para a "Cuesta de la Vega", onde se verificou o prodígio  de desmoronar-se um pedaço da muralha, deixando a descoberto a imagem pelas lâmpadas que ali deixaram acesas os cristãos, antes de taparem o nicho  em que ficou encerrada. 
Em virtude de que fenômeno ardiam aquelas duas lâmpadas, que a um e outro lado tinha a imagem, como se uma mão diligente tivesse o cuidado de alimentá-las, para que não se apagassem?...
Foi forçoso admitir a intervenção do sobrenatural, porque foi impossível demonstrar que por via ordinária pudesse alguém acender as duas misteriosas lâmpadas!
É tradição que a imagem foi ali escondida pelos cristãos quando da invasão maometana. 
Passados os primeiros momentos de júbilo que produziu tão portentoso achado, dispôs o Rei que no dia seguinte se fizesse a transladação da sagrada imagem para sua antiga igreja, e que uma cópia dela fosse colocada entre duas lâmpadas constantemente acesas, no nicho da muralha que durante mais de três séculos havia ocupado a imagem autêntica, e assim se fez no meio  das demonstrações de fervor e de júbilo do povo de Madri, que enfim encontrara a venerada imagem à qual deram o título de "Almudena", que quer dizer mercado ou celeiro, porque a parte da muralha onde foi descoberta a imagem fica perto do lugar onde os mouros tinham seu mercado e depósito de cereais.

Não tardou o povo de Madri a experimentar os benéficos efeitos da poderosa intercessão da SS. Virgem sob o título de Nossa Senhora de Almudena, tanto nas necessidades públicas como nas individuais.

Entre os primeiros é digno de menção especial o eficaz auxílio que prestou à vila nos dois cercos que lhe puseram os mouros, depois de haver sido reconquistada por D. Afonso VI. 

Em ambos deu o triunfo às armas cristãs, desbaratando os muçulmanos, e remediou os horrores da fome, que já se fazia sentir pela falta de víveres, fazendo-os chegar em abundância aos sitiados, por via milagrosa. 

A antiga igreja paroquial de Santa Maria (são várias e contraditórias as versões que circulam acerca da época da construção desta igreja), de Madri, onde foi venerada Nossa Senhora de Almudena, quase nada de notável oferecia no que se refere a sua arquitetura, mas a figura saliente do citado templo era a imagem de Nossa Senhora, cujo formoso rosto, majestoso aspecto e a bem executada escultura do Divino Infante que a Virgem sustenta em seus braços, justificam a crença de que a dita obra de arte foi executada, por inspiração divina, por artífices dos tempos apostólicos.

A imagem é de madeira olorosa, que recorda os cedros do Líbano, e a pintura que a cobre é tão consistente, que os estragos naturais do tempo não tem podido deteriorá-la. 

As jóias doadas à milagrosa imagem são muitas e de grande valor, assim como os mantos com que reis e rainhas, príncipes, nobres e outras pessoas de todas as classes sociais se comprazem em adorná-la.

A revolução de julho de 1854 derrubou o histórico templo, e a veneranda imagem teve de receber hospitalidade na próxima igreja do Sacramento, para onde foi transladado também o culto da paróquia.

Grande vergonha era para os madrilenos estar a milagrosa imagem de sua excelsa Padroeira numa igreja que não era sua; por isso foi projetada a construção de um grandioso templo dedicado a Nossa Senhora de Almudena, e que ao mesmo tempo servisse de Catedral da diocese de Madri-Alcalá.


(Versão resumida do livro "La Virgem en Espanã".)

Fonte: Livro Maria e seus gloriosos títulos, Edésia Aducci







quarta-feira, 11 de novembro de 2015

A fuga do pecado venial - Segundo grau de piedade




O pecado. - O que é o pecado venial?  - É a dominação da satisfação humana a ponto de levar à infração formal, embora leve, de um preceito divino. 
Dominação: Presa às criaturas pela atração do prazer, minha alma prefere sua própria satisfação aos interesses de Deus; ela se satisfaz, e desagrada a Deus. Ela conhece e percebe, ao menos um pouco, o preceito que obriga, e mesmo assim opta pela satisfação enganosa 60; o prazer a domina.
Mas não a domina a ponto de excluir totalmente a glória de Deus; a infração por ele produzida é apenas leve, seja porque a matéria não é grave em si mesma ou na proibição que ela envolve, seja porque há insuficiência de conhecimento ou de consentimento de minha parte. E, por ser de pouca gravidade, tal ofensa não extingue a vida; minha alma não chega a ser totalmente desviada e separada de Deus. É como uma ferida feita à alma, e também à glória de Deus.

Sua gravidade.  - Embora muito menos grave, em sua natureza e em seus efeitos, que o pecado mortal, este mal é ainda a desordem essencial, isto é, o maior de todos os males. Infelizmente, estou longe de o compreender, e mais ainda de o sentir! Quando se trata dos males que atacam meu prazer, compreendo-os instintivamente, e sinto-os poderosamente!... Mas, quanto ao mal que ataca a glória de Deus, compreendo-o tão pouco e sinto-o tão fracamente! Quem compreende o pecado? (Sl 18,13). Onde a sabedoria capaz de compreendê-lo, e a inteligência capaz de reconhecê-lo? (Oséias 14,10) Meu Deus! De que aberrações sou capaz, considerando frequentemente como "mal" aquilo que o é tão pouco, enquanto quase não percebo onde ele mais está presente!... Os males que me aflingem são, muitas vezes, tão úteis! Já o pecado venial nunca o é! As maiores infelicidades contêm sempre algum bem, ao passo que, mesmo no menor pecado venial, enquanto pecado, não há qualquer vestígio de bem!... Quem pode compreender o pecado?...

A reparação. - No segundo grau de sua ascenção, a piedade realizará a reparação dessa desordem. Nas circunstâncias em que há pecado venial, isto é, em que coloco minha satisfação acima da glória de Deus, ofendendo-o e ferindo-o, ela me tornará capaz de ceder à santa glória seu lugar e seus direitos. Já nenhum prazer a usurpará. 
Este grau será constituído pela facilidade e prontidão, bem arraigadas, de situar minha satisfação em seu devido lugar e no papel que lhe convém, sem permitir-lhe, deliberadamente, o menor desvio venial. E essa facilidade deve dominar e controlar meu espírito, meu coração e meu corpo. Diliges ex toto... Ela deve estender-se a todas as circunstâncias e a todas as criaturas. Se fosse preciso sacrificar a satisfação e mesmo imolar a própria vida, a alma o faria resolutamente, antes que cometer voluntariamente e deliberadamente um pecado venial. Quando a virtude puder elevar-se a esse ponto de clareza e de firmeza em que já nenhum temor, nenhuma atração a puder dominar e induzir a uma ofensa a Deus, mesmo leve, formalmente deliberada, ela terá atingido o segundo grau da piedade; está é a vida propriamente cristã. 

Altura desse grau. - Essa elevação não se atinge facilmente, nem comumente. É preciso, com efeito, purificar muitos recônditos interiores onde se escondem impulsos egoístas, apegos terrenos, apelos da sensualidade; é preciso desfazer, um por um, os nós apertados e embaralhados de tantos hábitos que aprisionam a natureza viciada, e que se traduzem, exteriormente, por palavras que exprimem julgamentos temerários, maledicências, irritação, difamação, etc., e também uma multidão de atos em que a verdade, a justiça, a caridade, o dever são omitidos ou comprometidos por interesse: plantas daninhas, infelizmente tão numerosas, que invadem quotidianamente as conversas e a conduta, sem que nos preocupemos em capinar o campo infestado por sua pestilência; é preciso, enfim, elevar as faculdades do ser a uma altura e firmeza que permitam ao "dique" da piedade sobressair e resistir às águas das paixões, seja qual for a força dos ventos e das chuvas. Tantos ventos se desencadeiam, tantas torrentes se abatem, tantas fissuras abalam a piedade! 61 Mesmo considerando apenas as misérias veniais, o trabalho é árduo! 
Em que ponto estarei?... Infeliz de mim, quantas faltas veniais!... A busca de mim mesmo não me leva, com frequência, a ofender a Deus, com meu pleno conhecimento e consentimento? E quantas faltas cometo, quase sem perceber, em consequência de maus hábitos que não combato como deveria! Quantas vezes os meus maus instintos, pouco ou nada reprimidos, provocam desentendimentos e atritos, sem que eu ao menos me importe! Ah! Meus pecados veniais! Já não os posso contar! Eles se tornaram mais numerosos que os cabelos de minha cabeça (Sl 39,13). 

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60. Pelo pecado venial, a pessoa prefere a própria satisfação àquilo que Deus ordena, mas não chega ao ponto de preferi-la ao próprio Deus, pois, nesse caso, haveria um pecado mortal, uma negação da ordem segundo a qual Deus deve ser amado acima de todas as coisas. E essa preferência só é venial se o mandamento desobedecido não implica na perda da amizade com Deus, isto é, se o ato desordenado não anula a disposição da vontade para renunciar à própria satisfação, caso esta conduzisse à destruição da ordem essencial da caridade.

61."Caiu a chuva, vieram as enxurradas, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela caiu. E foi grande a sua ruína!" (Mt 7,27).


Fonte: Livro A vida interior 
- simplificada e reconduzida ao seu fundamento, François de Sales Pollien, Joseph Tissot.