Padre Leo J. Trese -
A fé explicada
O que é um sacerdote?
Para saber o que é um sacerdote, é preciso saber primeiro o que é um sacrifício. Hoje em dia, a palavra "sacrifício" é usada em muitos sentidos. Mas, no seu significado estrito e original, é a oferenda de um dom a Deus, feita por determinado grupo, por intermédio de alguém que tenha o direito de representar esse grupo.
O propósito da oferenda é prestar culto coletivo a Deus; quer dizer, reconhecer o supremo domínio de Deus sobre os homens, agradecer-lhe as suas mercês, satisfazer pelos pecados do homem e pedir-lhe os seus benefícios. Deus não necessita dos nossos dons, pois tudo o que existe, foi Ele que o fez. Mesmo que lhe oferecêssemos uma montanha de diamantes, estes em si não teriam nenhum valor aos olhos de Deus. Antes de Jesus se ter dado a nós como oferenda perfeita no Sacrifício da Missa, o homem nada tinha a oferecer a Deus que fosse realmente digno dEle.
Não obstante, desde o começo da história humana, foi do agrado de Deus que o homem lhe manifestasse os seus sentimentos por meio de sacrifícios. De tudo o que Ele nos desse, tomaríamos o melhor (fossem cordeiros, bois, frutas ou grãos), e lho restituiríamos, destruíndo-o no altar como símbolo da nossa oferenda. Essas oferendas não podiam ser senão um gesto simbólico, como a gravata com que um joão-ninguém presenteia o seu tio rico e generoso pelo Natal. Mas expressavam melhor que as palavras os profundos sentimentos do coração humano para com Deus. "Deus onipotente - quereria dizer o ofertante -, sei que Tu me deste tudo o que tenho. Dou-te graças pela tua bondade. Peço-te perdão por não te servir melhor. Por favor, mostra-te bom e misericordioso para comigo". Um sacrifício é uma oração em ação. É a oração em ação de um grupo. E aquele que oferece o sacrifício em nome do grupo - como ministro de Deus - é o sacerdote.
Como os homens ofereceram sacrifícios a Deus desde o começo da raça humana, desde o começo houve sacerdotes. No primeiro período da história bíblica - a era dos patriarcas -, o sacerdote era o próprio chefe de família. Era ele quem oferecia os sacrifícios a Deus por si e pela família. Adão foi o sacerdote da sua família, assim como Noé, Abraão e os demais patriarcas o foram das suas. Mas, nos tempos de Moisés, Deus dispôs que o sacerdote do seu povo escolhido, os judeus, pertencesse à família de Aarão, da tribo de Levi. O primogênito de cada geração dos descendentes de Aarão seria o sumo-sacerdote, e os demais levitas seus ajudantes.
Quando se estabeleceu a Nova Lei de Cristo, terminou a Lei Antiga e com ela o sacerdócio que lhe era próprio. A Nova Lei do amor teria um sacrifício e um sacerdócio novos. Na Última Ceia, Jesus instituiu o Santo Sacrifício da Missa, em que o dom oferecido a Deus não seria mais uma simples oferenda simbólica de ovelhas ou bois, de pão ou vinho. Pela primeira vez e para sempre, seria um dom digno de Deus; seria o dom do próprio Filho de Deus; um dom de valor infinito, tanto como o próprio Deus é infinito. Na Santa Missa, sob as aparências de pão e vinho, Jesus renovaria incessantemente o oferecimento que, de uma vez para sempre, fez na cruz, imolando-se a Si próprio. Na Santa Missa, dar-nos-ia a cada um de nós, seus membros batizados, a oportunidade de nos unirmos a Ele nesse oferecimento.
Mas quem seria o sacerdote humano que estaria diante do altar, o homem cujos lábios e mãos Cristo usaria para a oferenda de Si? Quem seria o sacerdote humano a quem Cristo daria o poder de tornar Deus-Homem presente no altar, sob as aparências de pão e de vinho? Para começar, havia onze sacerdotes (não há a certeza de que Judas estivesse presente no momento em que os Apóstolos foram feitos sacerdotes). Na Última Ceia, como sabemos, Jesus conferiu o sacerdócio aos seus Apóstolos quando lhes mandou: Fazei isto em memória de mim (Lc 22,19); e, ao mandá-lo, lhes deu o poder de fazer o que Ele acabara de fazer.
Foi esse poder, o poder de oferecer sacrifícios em nome de Crsito e no do Corpo Místico, a Igreja (o que significa em nome dos que estão unidos a Cristo pelo batismo, isto é, no seu nome e no meu), que tornou os Apóstolos sacerdotes. A esse poder de mudar o pão e o vinho no seu Corpo e Sangue, Jesus acrescentou na noite do Domingo da Ressureição o poder de perdoar os pecados em seu nome, quando disse: Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados. Àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos (Jo 20,23). Além desses poderes, Cristo conferiu aos Apóstolos o poder de evangelizar - anunciando em nome de Cristo a Boa Nova - e o de reger como Pastores o povo de Deus.
Esse poder sacerdotal que Jesus conferiu aos seus Apóstolos não era para morrer com eles. Jesus veio salvar as almas de todos os homens, até o fim do mundo. Por conseguinte, os Apóstolos transmitiram esse poder a outros homens na cerimônia que hoje chamamos o sacramento da Ordem Sagrada. No livro dos Atos dos Apóstolos, vemos relatada uma das primeiras (se não a primeira) das ordenações conferidas dos Apóstolos: Agradou essa proposta [de ordenar sete diáconos] a toda a assembléia. Escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Pármenas e Nicolau, prosélito de Antioquia. Apresentaram-nos diante dos Apóstolos, os quais, depois de terem orado, lhes impuseram as mãos (At 6, 5-6).
Esses homens foram ordenados diáconos, não sacerdotes. Mas a cena permite-nos ver os Apóstolos compartilhando e transmitindo o sagrado poder que Cristo lhes outorgara. Com o decorrer do tempo, os Apóstolos consagraram bispos, para que estes prosseguissem a sua missão. Esses bispos, por sua vez, ordenaram mais bispos e presbíteros, e estes últimos bispos, por sua vez, outros mais. De tal modo que o sacerdote católico de hoje pode dizer, na verdade, que o seu poder sacerdotal, recebido pelo sacramento da Sagrada Ordem, lhe foi dado pelo próprio Cristo, numa cadeia ininterrupta que remota até Ele.
Quase dois mil transcorreram desde aquela ocasião em que Jesus Cristo elevou os onze Apóstolos ao sacerdócio, na noite da Páscoa, quando se reuniu com eles para celebrá-la. Desde então, talvez tenha havido alguma ocasião na história da Igreja em que se contasse com suficiente número de sacerdotes para atender às necessidades do Povo de Deus, mas não é certamente o que acontece nos nossos dias. São precisos sacerdotes, sacerdotes e mais sacerdotes; é uma das necessidades mais urgentes de hoje.
São precisos sacerdotes fiéis e piedosos no nosso próprio país, onde tantas paróquias estão insuficientemente dotadas e muitas almas são parcamente atendidas. A necessidade é ainda maior em terras de missão, onde povos inteiros clamam por um sacerdote, e não há sacerdotes para enviar. Podemos estar certos de que Deus, cujo interesse na salvação das almas é absoluto, não tem a culpa deste estado das coisas. Podemos estar certos de que Ele chama continuamente ao sacerdócio muitos jovens que, por uma razão ou por outra, não prestam ouvidos à sua voz.
Nenhum jovem deveria escolher o seu estado na vida sem antes se perguntar: "Não será que Deus me quer sacerdote?" Note-se que a pergunta não é: "Gostaria eu de ser sacerdote?", mas sim: "Deus quer que eu seja sacerdote?" É uma pergunta que se deveria formular e ponderar na oração por um período de tempo razoavelmente longo. É evidente que Deus não quer que todos os jovens se façam sacerdotes; há outras vocações a cumprir, especialmente a da paternidade. Mas todos os homens serão mais felizes no seu matrimônio cristão e na sua paternidade se antes se certificarem de que não fecharam os ouvidos à chamada de Deus para uma paternidade espiritual.
Quais são os sinais da vocação para o sacerdócio? Na verdade, a vocação é uma chamada do bispo. Quando um bispo comunica a um jovem, ao término dos estudos do seminário, que deve preparar-se para receber o sacramento da Ordem Sagrada, esse é o fator essencial da vocação. Para responder a essa chamada, é necessário que o jovem esteja em estado de graça e tenha um caráter excepcionalmente sólido. É imprescindível que tenha concluído os necessários estudos de filosofia e teologia.
É necessário também, conforme o novo Código de Direito Canônico, que tenha 25 anos feitos; sem dispensa, não se pode administrar o sacramento da Ordem a jovens de menos idade. É necessário que seja filho de pais católicos validamente casados. A Igreja confia muito na formação que o candidato ao sacerdócio recebeu num lar cabalmente católico, no espírito de fé e amor a Deus em que cresceu, porque moldam decisivamente o caráter do homem que virá depois. Mas a Igreja dispensa desta condição o filho de um matrimônio misto, e até um filho ilegítimo, se os demias fatores para o sacerdócio forem favoráveis. Finalmente, o candidato à Ordem Sagrada deve ter reta intenção: a intenção de se dedicar ao serviço de Deus no sacerdócio, para santificar a sua alma e santificar os outros. No seu coração não deve haver nenhum outro motivo além desse, quando se ajoelha para receber o sacramento da Ordem Sagrada.
Estamos, porém, falando do fim do caminho para o sacerdócio. O que é que se passa com o seu começo? Como é que um rapaz pode conhecer esse caminho e começar a segui-lo? Em primeiro lugar, não se deve esperar nenhuma revelação especial, pois, pelo menos, não é isso o normal. Deus não dará um piparote no rapaz e lhe dirá: "Ei, você. Quero que seja sacerdote!" Deus deu-nos cabeça e quer que a utilizemos. Ele iluminará a nossa razão e guiar-nos-á suavemente, se lhe dermos essa oportunidade na nossa oração pessoal, mas espera também que sigamos os sinais indicadores, já que os pôs para isso.
Deixemos que o rapaz pergunte a si mesmo: "Tenho boa saúde?" Não é necessário que seja um super-homem, mas uma constituição enfermiça não é o que mais ajuda a perseverar nos longos anos de estudo. Depois, deve perguntar-se: "Tenho uma capacidade razoável para estudar e para aprender?" Não precisa ser um gênio, mas, em geral, os estudos que se requerem são mais exigentes que em outras instituições docentes. É muito provável que, se habitualmente tem notas más, tudo aponte numa direção oposta ao sacerdócio.
As perguntas continuam: "Confesso-me regularmente e comungo com frequência?" Se a resposta for "não", aí está um defeito que pode ser facilmente reparado: basta começar nesse momento. Finalmente, o jovem deve interrogar-se: "Vivo habitualmente em estado de graça, evito o pecado mortal?" Se a resposta for negativa, isso também se pode remediar facilmente com a ajuda da graça e dos sacramentos. Para que um jovem pense no sacerdócio, não é necessário que seja um santo. Antes, porém, é preciso que queira ser melhor. Boa saúde, inteligência e virtude: são dons da natureza e da graça que constituem os pré-requisitos para o sacerdócio.
Se um jovem está em condições de responder afirmativamente às quatro perguntas anteriores e encontra no seu coração a generosidade suficiente para se entregar a Deus e ao serviço dos seus irmãos, então convém que fale logo com o seu pároco ou o diretor espiritual sobre a possibilidade de ir para o seminário. E quando revelar as suas intençções aos pais, estes devem dar-lhe toda a espécie de ânimos. Não têm por que empurrá-lo, mas sim animá-lo. Mais de uma vocação de perdeu pela falsa prudência de alguns pais que diziam: "Espera até terminares o secundário", "Espera até o fim do curso". Como se pudesse haver esperas quando Deus chama! Não há perigo de que o jovem seja coagido a perseverar no seminário. Pelo contrário, até chegar ao final, deverá provar continuamente que possui as condições necessárias.
"Ninguém tem direito a receber o sacramento da Ordem. Com efeito, ninguém pode arrogar-se tal encargo. É-se chamado a ele por Deus. Aquele que julga reconhecer em si sinais do chamamento divino ao ministério ordenado, deve submeter humildemente o seu desejo à autoridade da Igreja, à qual incumbe a responsabilidade e o direito de chamar seja quem for para receber as ordens. Como toda e qualquer graça, este sacramento não pode ser recebido senão como dom imerecido" (n. 1578).
"Todos os ministros ordenados da Igreja Latina, à exceção dos diáconos permanentes, são normalmnte escolhidos entre os homens crentes que vivem celibatários e têm vontade de guardar o celibato por amor do Reino dos Céus (Mt 19,12). Chamados a consagrarem-se totalmente ao Senhor e às << suas coisas >>, dão-se por inteiro a Deus e aos homens. O celibato é um sinal desta vida nova, ao serviço da qual o ministro da Igreja se consagra; aceito de coração alegre, anuncia de modo radioso o Reino de Deus" (n. 1579).
Isto é o que um jovem e seus pais podem fazer. Mas o que todos devem fazer é pedir todos os dias em nossas orações e em nossas Missas pela santidade dos sacerdotes e dos seminaristas, com uma súplica especial para que muitos jovens ouçam a voz de Deus e se encaminhem para o altar.
OS GRAUS DA ORDEM SAGRADA
O sacramento da Ordem difere dos outros sacramentos por existirem neles três graus.
O primeiro grau são os bispos que, como sucessores dos Apóstolos, têm a plenitude do sacramento da Ordem e participam do Sacerdócio de Cristo, sumo e eterno Sacerdote e Cabeça da Igreja, "presindindo no lugar de Deus o rebanho do qual são pastores, como mestres da doutrina, sacerdotes do culto sagrado e ministros do governo" (Lumen Gentium, n. 20).
O segundo grau é constituído pelos presbíteros - os sacerdotes -, que estão unidos aos bispos na dignidade sacerdotal, embora só o bispo possua a plenitude do sacerdócio e o presbítero o possua em grau subordinado, como cooperador da Ordem episcopal. "Em virtude do sacramento da Ordem, segundo a imagem de Cristo, sumo e eterno Sacerdote, eles são consagrados para pregar o Evangelho, apascentar os fiéis e celebrar o culto divino, de maneira que são verdadeiros sacerdotes do Novo Testamento" (Lumen Gentium, n. 28).
O terceiro grau é constituído pelos diáconos. Não possuem o sacerdócio, mas um ministério sagrado para que, "fortalecidos com a graça sacramental, sirvam o Povo de Deus no serviço da Liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão com o bispo e seu presbitério" (Lumen Gentium, n. 29).
"A doutrina católica, expressa na Liturgia, no Magistério e na prática constante da Igreja, reconhece que existem dois graus de participação ministerial no sacerdócio de Cristo: o episcopado e o presbiterado. O diaconado destina-se a ajudá-los e a servi-los. Por isso, o termo sacerdos designa, no uso atual, os bispos e os presbíteros, mas não os diáconos. Todavia, a doutrina católica ensina que os graus de participação sacerdotal (episcopado e presbiterado) e o grau de serviço (diaconado), todos três são conferidos por um ato sacramental chamado <<ordenação>>, ou seja, pelo sacramento da Ordem" (n. 1554).
Diáconos, presbíteros e bispos: eis os três graus da Ordem Sagrada instituída por Jesus Cristo. Cada um deles, como cada sacramento, aumenta a graça santificante. Cada grau imprime um caráter na alma; cada grau ascendente, como um sol gradativamente mais brilhante, envolve e contém o caráter do que havia precedido. É nesse caráter que se enraíza e se fundamenta o direito e o poder próprios da Ordem que se recebe: para o diácono, e o de batizar, pregar, administrar o Sagrada Comunhão, assistir ao matrimônio e abençoá-lo, etc.; para o presbítero, o de mudar o pão e o vinho no Corpo e Sangue de Cristo e o de perdoar os pecados; para o bispo, o único que tem a plenitude do sacerdócio, o de confirmar e o de ordenar, isto é, o de transmitir a outros o sacerdócio por meio do sacramento da Ordem Sagrada. E além do aumento da graça santificante e do caráter sacerdotal, o ordenado recebe a graça especial do sacramento, que clama a Deus em seu favor para que receba todas as graças atuais de que possa necessitar para o fiel cumprimento da sua missão.
Nos primeiros tempos do Cristianismo, a ordem do diaconato era uma meta em si, e os diáconos eram importantes auxiliares dos bispos e dos sacerdotes. Em séculos mais recentes, o diaconato caiu em desuso como "ordem" ativa, e converteu-se em mero passo para o sacerdócio. Assim, só se podiam encontrar diáconos nos seminários, e um diácono permanecia nessa condição por poucos meses, até receber a ordenação sacerdotal. Felizmente, o Concílio Vaticano II restaurou a primitiva concepção do diaconato. Os seminaristas continuarão a receber a Ordem do diaconato antes da ordenação sacerdotal, mas procura-se que haja outros homens (mesmo casados) que sejam ordenados diáconos com o propósito de permanecerem nessa condição. Ajudarão os bispos e os sacerdotes, batizando, pregando, distribuindo a Sagrada Comunhão, assistindo e abençoando o matrimônio, instruindo o povo, presidindo às orações dos fiéis e a certos atos de culto, oficiando enterros e exéquias, dedicando-se a ofícios de caridade e administração. Na verdade, farão quase tudo o que faz um sacerdote, a não ser celebrar a Santa Missa e confessar.
"A partir do Concílio Vaticano II, a Igreja Latina restabeleceu o diaconato <<como grau próprio e permanente da hierarquia>> (LG 29), enquanto as Igrejas do Oriente o tinham sempre mantido. Este diaconato permanente, que pode ser conferido a homens casados, constitui um enriquecimento importante para a missão da Igreja. Com efeito, é próprio e útil que homens, cumprindo na Igreja um ministério verdadeiramente diaconal, quer na vida litúrgica e pastoral, quer nas obras sociais e caritativas, <<sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitidas desde os Apóstolos, e mais estreitamente ligados ao altar, para que cumpram o seu ministério mais eficazmente por meio da graça sacramental do diaconato>> (AG 16)" (n.1571).
No entanto, a maioria dos que recebem o diaconato, fazem-no como passo para se tornarem sacerdotes, presbíteros. Este segundo passo do sacramento da Ordem Sagrada será para eles o definitivo - exceto para os que venham a ser bispos - e ninguém poderá sonhar ou desejar uma dignidade maior: ao inclinar-se cada manhã sobre o pão e o vinho e pronunciar as palavras de Cristo: "Isto é o meu Corpo... Isto é o meu Sangue", o sacerdote sentir-se-á aniquilado pelo sentimento da sua própria indignidade, pela consciência da sua humana fraqueza. E, certamente, seria aniquilado se não fosse sustentado pela graça do sacramento da Ordem Sagrada, que Deus concede infalivelmente a quem a pede com humildade.
"Em virtude do sacramento da Ordem, os sacerdotes participam das dimensões universais da missão confiada por Cristo aos Apóstolos. O dom espiritual que receberam na ordenação prepara-os, não para uma missão limitada e restrita, <<mas sim para uma missão de salvação de dimensão universal, até os confins da Terra>> (PO 10)" (n. 1565; cf. também os ns. 1562-4 e 1566-8).
Evidentemente, este poder de oferecer o sacrifício da Hóstia Perfeita a Deus, como instrumento vivo de Cristo Sacerdote e em nome de todo o povo de Deus, é o que distingue um sacerdote de um ministro ou pastor protestante. Não seria incorreto chamar ministro ou pastor a um sacerdote, pois é ministro do altar, servidor de Cristo e do rebanho de Cristo. É também pregador, e poder-se-ia chamá-lo assim, pois nos prega a mensagem da salvação.
Mas, se é correto chamar a um sacerdote ministro ou pregador, é incorreto chamar sacerdote a um ministro ou pregador protestante. O ministro protestante não tem o poder de oferecer sacrifícios, que é precisamente o que torna sacerdote um sacerdote. Aliás, os ministros protestantes - com exceção dos membros da Alta Igreja Anglicana ou Episcopaliana - nem sequer acreditam nesse poder. Alguns ministros episcopalianos ou anglicanos consideram-se a si mesmos sacerdotes, mas infelizmente estão enganados. Não têm quem lhes possa conferir o poder sacerdotal.
A linha de sucessão pela qual o poder sacerdotal chegou até nós, de Cristo para os Apóstolos, de bispo para bispo, neles quebrou-se há séculos, quando a Igreja Anglicana repudiou totalmente a idéia da Santa Missa e de um sacerdote sacrificial. Em tempos mais modernos, alguns membros da Alta Igreja Anglicana reviveram a idéia da Missa, mas não têm bispos que sejam verdadeiros sucessores dos Apóstolos, nem bispos que possuam qualquer dos poderes que o sacramento da Ordem Sagrada confere. Não mencionamos este fato com espírito de altivo desdém, mas como um triste fato histórico; devemos sentir-nos mais motivados a renovar a nossa oração pelos irmãos separados, para que voltem ao autêntico e único rebanho de Cristo.
OS BISPOS E OUTRAS DIGNIDADES
O terceiro e o mais elevado passo do sacramento da Ordem Sagrada é o episcopal. Quando se necessita de um novo bispo para presidir a uma diocese ou para alguma missão importante dentro da Igreja, o Papa, como sucessor de Pedro, designa o sacerdote que deve ser elevado à ordem episcopal. Esse sacerdote recebe então a terceira "imposição de mãos" de outro bispo (as duas anteriores foram no diaconato e no presbiterato) e, por sua vez, converte-se em bispo. Ao poder de oferecer a Santa Missa e de perdoar os pecados, junta-se agora o de administrar a Confirmação por direito próprio e o poder exclusivo dos bispos de administrar o sacramento da Ordem Sagrada, de poder ordenar outros sacerdotes e de consagrar outros bispos.
"<<Entre os vários ministérios que na Igreja se exercem desde os primeiros tempos, consta da Tradição que o principal é o daqueles que, constituídos no episcopado em sucessão ininterrupta, são os transmissores os múnus apostólico>> (LG 20).
"Para desempenhar tão elevadas funções, os Apóstolos foram enriquecidos por Cristo com uma infusão especial do Espírito Santo, que sobre eles desceu; e eles mesmos transmitiram este dom do Espírito aos seus colaboradores, pela imposição das mãos, dom que foi transmitido até aos nossos dias através da consagração episcopal>> (LG 21).
"O Concílio Vaticano II <<ensina que, pela consagração episcopal, se confere a plenitude do sacramento da Ordem, aquela que é chamada sumo sacerdócio e cume do sagrado ministério, na tradição litúrgia e no santos Padres>> (Ibid.)" (ns. 1555-7; cf. também os ns. 1558-61).
Com esta terceira imposição de mãos do bispo consagrante (habitualmente acompanhado por outros bispos, chamados consagrantes), o novo bispo recebeu o Espírito Santo pela última vez. O Espírito Santo desceu sobre ele pela primeira vez quando recebeu o batismo, e deu-lhe o poder de participar com Cristo da sua oferenda sacrificial e de receber a graça dos demais sacramentos. O Espírito Santo desceu outra vez sobre ele na Confirmação, e conferiu-lhe o poder de propagar a fé com a palavra e com obras. O Espírito Santo veio mais uma vez, com novos poderes e graças, no diaconato e no presbiterato. E, agora, ao ser ordenado bispo, o Espírito Santo desce sobre ele pela última vez: já não há novos poderes que Deus possa conferir ao homem. Pela última vez, a sua alma ficará marcada com um caráter - o pleno e completo caráter do sacramento da Ordem Sagrada -, o caráter episcopal.
A essência da ordem episcopal reside no poder de o bispo se perpetuar a si mesmo, no poder de ordenar sacerdotes e de consagrar outros bispos, isto é, no poder de ele, sucessor dos Apóstolos, perpetuar essa sucessão apostólicas. É um poder que jamais se poderá perder. Assim como um sacerdote nunca perde o poder de converter o pão e o vinho no Corpo e Sangue do Senhor, mesmo que apostate e abandone a Igreja Católica, um bispo jamais poderá perder o seu poder de ordenar outros sacerdotes e bispos, nem mesmo se abandonar a Igreja Católica.
Aqui se encontra a principal diferença entre a Igreja Católica e as diversas confissões protestantes. Como já vimos, os protestantes não creem na Santa Missa nem num sacerdócio que inclua o poder de oferecer o Santo Sacrifício e, por conseguinte, não creem no sacramento da Ordem Sagrada. Fez-se notar que os membros da Alta Igreja Anglicana e Episcopaliana creem na Missa e no sacerdócio, mas deixaram de ter bispos e sacerdotes reais no século XVI. Os que estavam então à testa da Igreja na Inglaterra eliminaram da cerimônia da ordenação toda a referência à Missa e ao poder de oferecer o Santo Sacrifício. Sem a intenção de ordenar sacerdotes sacrificiais, o sacramento da Ordem é inválido, não há tal sacramento. Ocorre o mesmo com qualquer sacramento: faltando a intenção, falta o sacramento. Se um sacerdote pronuncia as palavras da Consagração tendo diante de si pão e vinho (por exemplo, no almoço), o pão e o vinho não ficarão consagrados se o sacerdote não teve a intenção de fazê-lo. Seja quem for que administre um sacramento, deve ter a intenção de fazer o que o sacramento pretende fazer, ou então o sacramento será inválido. Foi por isso que se extinguiram os bispos e os sacerdotes na Igreja Anglicana: ao suprimirem na cerimônia da ordenação a intenção de ordenar sacerdotes e bispos que oferecessem o Sacrifício, suprimiram os seus bispos e sacerdotes.
As coisas são muito diferentes com as chamadas Igrejas Ortodoxas, como a Grega, a Russa, a Romena, a Armênia e demais. Há uns mil anos, quando todo o mundo cristão era católico, os hierarcas eclesiásticos de alguns países separaram-se de Roma, rompendo a sua comunhão hierárquica com o Papa. Não obstante, continuaram a crer nas verdades que a Igreja Católica ensinava; os seus bispos continuaram a ser bispos, e continuam a ordenar sacerdotes validamente e a consagrar os seus sucessores. Com o poder sacerdotal assim transmitido através dos séculos, as igrejas ortodoxas possuem ainda hoje a Missa e os sacramentos. E por isso, nos casos de necessidade previstos pelas leis da Igreja, um católico pode assistir a uma Missa numa igreja ortodoxa, e - nos lugares onde não há um sacerdote católico - poderia até confessar-se com um padre ortodoxo e receber a comunhão e a Unção dos Enfermos. No total, há dezesseis ramos da Igreja Ortodoxa.
As igrejas ortodoxas não devem ser confundidas com os membros da Igreja Católica que pertencem aos ritos orientais. Quase todos nós somos católicos de rito latino. Mas há grandes grupos de católicos sem alguns países, sobretudo na Europa oriental e na Ásia, que já desde os começos da Igreja tiveram a Santa Missa e os sacramentos na sua própria língua; assim, por exemplo, os católicos gregos ou os católioos armênios. Muitas das suas cerimônias são diferentes das nossa. Mas creem no Papa como cabeça da Igreja e são tão verdadeiros católicos como você e como eu. Os católicos de rito latino podem perfeitamente assistir à missa, sempre que o desejem, numa igreja católica de rito oriental - como a maronita ou a melquita - e receber nela a Sagrada Comunhão. Orientais ou ocidentais, somos um em Cristo.
Diácono, sacerdote, bispo: os três graus do sacramento da Ordem. Acima do bispo não existe poder maior que Deus dê aos homens. Então... que acontece com o Papa? Não tem mais poder que os bispos ordinários? E que se passa com os cardeais e os arcebispos? Onde é que entram e que fazem?
Não. O Papa não tem um poder espiritual maior que o dos demais bispos. Tem mais autoridade, uma jurisdição mais extensa que a de qualquer outro bispo. Por ser bispo de Roma, sucessor de São Pedro, tem autoridade sobre toda a Igreja. Estabelece leis para toda a Igreja. Designa os sacerdotes que serão bispos e atribui dioceses a esses bispos. Goza também de um privilégio muito especial, que Jesus deu a São Pedro e aos seus sucessores: o privilégio da infalibilidade. Por este privilégio divino, Deus preserva o Papa do erro quando se pronuncia definitivamente, para a Igreja universal, sobre matérias de fé ou de moral, usando da plenitude da sua autoridade docente. Mas o poder essencial do Santo Padre, ao ser eleito Papa, não se torna maior do que quando o consagraram bispo.
"O Papa, bispo de Roma e sucessor de São Pedro, <<é princípio perpétuo e visível e fundamento da unidade que liga entre si tanto os bispos como a multidão dos fiéis>> (LG 23). Em virtude do seu cargo de vigário de Cristo e pastor de toda a Igreja, o pontífice romano tem sobre a mesma Igreja um poder pleno, supremo e universal, que sempre pode exercer livremente>> (LG 22).
"<<O Colégio ou corpo episcopal não tem autoridade a não ser em união com o pontífice romano [...] como sua cabeça>>. Como tal, esse Colégio é <<também sujeito dum poder supremo e plenário sobre toda a Igreja, poder que, no entanto, não pode ser exercido sem consentimento do pontífice romano>> (LG 22)" (ns. 882-3).
Para entendermos o ofício de arcebispo, devemos conhecer um pouco da composição física da Igreja. O mundo divide-se em dioceses ou circunscrições equivalentes. Deve haver mais de duas mil divisões dessas na Igreja de hoje. Cada diocese ou prelazia territorial tem limites geográficos bem precisos, como os têm as nações e as províncias. Só algumas circunscrições - como os vicariatos militares e as prelazias pessoais - não têm território, e abrangem um grupo de pessoas - por exemplo, os militares - de um determinado país. Cada pessoas domiciliada dentro dos limites de uma diocese pertence a essa diocese. Cada diocese divide-se em paróquias que, por sua vez - fora os casos de paróquias pessoais, como paróquias para grupos de imigrantes, para universitários, etc. - têm limites geográficos bem definidos, e qualquer pessoa domiciliada dentro desses limites pertence a essa paróquia, esteja ou não "registrada". Os únicos que podem dizer verdadeiramente que não pertencem a nenhuma paróquia são os errantes permanentes, aqueles que não têm domicílio fixo em nenhum lugar.
À frente de cada diocese há um bispo. O bispo que governa uma diocese chama-se o Ordinário dessa diocese. O título de Ordinário distingue o bispo que governa uma diocese dos bispos Titulares, que são os que não têm diocese própria. Quando são consagrados bispos, pode-se dar a estes o título de uma diocese extinta, geralmente o de uma cidade da África ou da Ásia que deixou de existir como diocese séculos atrás. Um bispo titular pode ser designado para ajudar o Ordinário de uma diocese grande, e nesse caso é chamado de bispo auxiliar. Ou pode também ocupar-se de algum trabalho diocesano ou interdiocesano, como ser reitor de uma universidade católica ou delegado papal.
Várias dioceses adjacentes agrupavam-se para formar uma província da Igreja. A diocese principal da província chama-se arquidiocese, e o seu Ordinário, arcebispo. Este não é o "chefe" das dioceses da província, pois cada bispo governa a sua própria diocese. Mas tem a precedência de honra e o dever de convocar os bispos da província e de presidir às suas reuniões. E, assim como há bispos titulares, há também arcebispos titulares, que não estão à frente de nenhuma arquidiocese. O Papa deu-lhes esse tratamento como uma dignidade em reconhecimento pelo importante trabalho de que se ocupam ou pelo meritórios serviços que prestaram.
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Fonte: A fé explicada, Padre Leo J. Trese. Editora Quadrante, 2014. 14ª edição. Cap. 24, pág. 412-424.
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